O grupo musical folclórico foi criado ainda no século 19, na cidade de Crato, no interior do Ceará, por José Lourenço da Silva, conhecido como Aniceto, descendente de índios Cariri.
Originou-se no meio dos escravos africanos, segundo alguns estudiosos, mas se desenvolveu e adquiriu suas peculiaridades principais entre o próprio povo do Cariri.
Outros justificam a influência indígena, possivelmente devido ao uso de instrumentos, de características indígenas.
O grupo mantém-se em atividade até hoje, século XXI, com três gerações sucedendo-se na sua formação, incluindo a de Aniceto. Os três filhos de José Lourenço da Silva, integrantes do grupo, herdaram o mesmo apelido do pai, Aniceto. A origem do termo cabaçal provém de duas versões: uma a de que antigamente os tambores eram confeccionados de pele de bode estirada sobre cabaças; outra, a de que o nome vem de um ritual dos índios Cariris que habitavam a Serra do Araripe.
Gerações de uma mesma família mantém a arte de tocar, dançar e representar o Cariri em uma manifestação autêntica, única e original.
O grupo preserva sua cultura através de composições inspiradas no trabalho da roça e na observação do cotidiano da vida do sertão.
As performances contam com instrumentos de sopro e percussão, como pífanos (pequenas flautas transversais), zabumba, caixa e pratos de metal.
Dança do marimbondo – Irmãos Aniceto
A Banda Cabaçal dos Irmãos Aniceto alcançou projeção internacional. Já se apresentou ao lado de importantes nomes da música brasileira, como o multi-instrumentista Hermeto Paschoal e o conjunto Quinteto Violado. Também participou de diversos filmes e documentários para a TV, durante sua trajetória artística.
Mesmo nos anos 2000, os integrantes mantêm a tradição do grupo de utilizar apenas pífanos feitos de tabocas e confeccionar os instrumentos com peles de bode ou carneiro esticadas sobre troncos de madeira, com o miolo retirado a golpes de machado.
200 anos de história
Em 2015 a banda foi reverenciada pelos seus 200 anos. Grupos de tradição popular e seus mestres participaram da festa do bicentenário da banda, que foi anunciada como patrimônio da cultura imaterial do Crato, reconhecida por decreto, em 24 de maio de 2015. A festança contou com o descerramento de uma placa alusiva ao aniversário, além do lançamento do livro “Banda Cabaçal dos Irmãos Aniceto: Memórias e Afetos”, que reúne artigos de pessoas que têm, de alguma forma, uma relação com o grupo, e um acervo fotográfico para fazer um registro da data.
Danças Brasileiras – Brincante em Casa com Antônio Nóbrega – Irmãos Aniceto
A banda, que se tornou um ícone da cultura e da tradição no sul do estado do Ceará, traz a ancestralidade dos índios kariris. As comemorações aconteceram na casa do integrante mais antigo da banda, o mestre Raimundo Aniceto, com 82 anos na ocasião.
O aniversário do grupo, que chega à sua quarta geração, acontece todos os anos com uma terreirada. O grupo já chegou a gravar quatro discos. Conforme o memorialista do Crato, Huberto Cabral, é uma das mais divulgadas do Cariri no exterior, já tendo percorrido Portugal, Espanha, França e, em agosto de 2015 fez apresentações na Turquia para participar de um festival na região da Capadócia.
Segundo os historiadores, a banda se traduz no que há de mais autêntico na cultura e não se propõe a ser um produto exótico para turista ver. É a ancestralidade presente nesses descentes dos índios kariris, primeiros habitantes dessa região. Eles vieram trazer o seu legado de saberes e fazeres, de pai para filho.
Herança familiar
O mestre Raimundo destacava a grande alegria de receber a herança familiar e dar continuidade à banda, que começou com o seu avô e seguiu com o pai, que era índio kariri. Para ele, quem nasce para a cultura já está feito. “A banda veio para alegar o Brasil. É a cultura legítima, ao vivo”, costumava dizer Raimundo Aniceto, falecido aos 86 anos, em 15 de outubro deste ano, 2020, em Crato, no interior do Ceará, vítima da Covid-19. O artesão, músico e brincante era o mais antigo dos integrantes vivos da tradicional Banda.
Museu Casa do Mestre Raimundo Aniceto – Crato/Ceará – Brasil
Segundo os familiares, Raimundo Aniceto estava doente por problemas no coração, mas a Covid-19 só foi descoberta no hospital. Há quatro anos, o artesão já havia sofrido um acidente vascular cerebral (AVC) que prejudicou sua dicção.
Nascido em 14 de fevereiro de 1934, Raimundo começou a tocar na banda aos seis anos de idade, junto com seus irmãos, pai e primos. Todos os instrumentos utilizados pelo grupo eram fabricados à mão pelos próprios integrantes. Os pifes eram feitos de taboca e a zabumba fabricada com timbaúba e couro de bode. A produção deste último sempre foi tarefa do mestre da cultura.
Mestre Raimundo Aniceto – Luthiers do Cariri Cearense
Em agosto do ano passado, foi inaugurado o museu orgânico do Mestre Raimundo Aniceto, projeto do Serviço Social do Comércio do Ceará (Sesc/CE), em parceria com a Fundação Casa Grande de Nova Olinda, que tornou a casa de Raimundo em espaço para visitação e preservação da história do grupo e seus instrumentos artesanais.
Legado
Para o cantor, ator e produtor cultural João do Crato, a Banda Cabaçal é a essência da tradição da ancestralidade no Cariri e a presença de Raimundo sempre foi fundamental. “Ele sempre foi um dos grandes mestres empenhados a preservar o que vinha da oralidade, dos mais antigos, do seu pai, mas também mantinha muito a história de se reinventar. Tinha uma infinidade de peças, cânticos e apresentações”, descreve.
João classifica Raimundo como “um menino ‘véio’ brincante”. “Aquela energia, do curumim, dos indígenas. O que mais me lamenta é que essa magia, esse canto, vai se quebrando e eles davam passagens a estes elementos. Nunca o vi triste. Mesmo nas contradições, nas inúmeras viagens que fizemos, sempre teve uma coisa de alegria, a alegria de representar. A partida é dolorosa. Mas vamos ficar raiado nessa luz que ele deixou”, finaliza.
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Banda Cabaçal dos Irmãos Aniceto
Rua Manoel Macedo, 301, Bairro Seminário
Crato/CE
(88) 3523-2365
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Irmãos Aniceto – Documentário
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