O Triângulo Mineiro está sob ataques severos da praga, que provoca a redução da formação do grão de milho, resultando em menor peso e qualidade
A cigarrinha do milho (Dalbulus maidis) é um inseto sugador de ocorrência conhecida a mais de 18 anos nas lavouras de milho do Brasil. Sua ocorrência provoca grandes prejuízos a cultura, se tornando no contexto atual, a principal praga da cultura do milho. A praga que se reproduz e provoca danos diretos exclusivamente na cultura do milho, através da sucção da seiva da planta e principalmente através da transmissão de microrganismos causadores do chamado complexo do enfezamento. O inseto é vetor do espiroplasma (causador do enfezamento pálido), do fitoplasma (causador do enfezamento vermelho) e também do raiado fino ou vírus da risca.
Esse complexo de microrganismos transmitidos pela cigarrinha se desenvolve nos vasos condutores de seiva, impedindo a adequada movimentação de água, nutrientes e energia no sistema vascular da planta. Esse processo desencadeia distúrbios hormonais e fisiológicos além de debilitar o sistema de defesa da planta, sendo porta de entrada para doenças oportunistas que se desenvolvem no colmo e espigas do milho.
A ocorrência de doenças secundarias na cultura como fungos que atacam o colmo das plantas é um dos principais causadores de perdas na cultura, já que pode ocorrer a má formação das espigas e dos grãos (grãos chochos) e principalmente o tombamento das plantas, observando-se a dizimação de lavouras, com perdas que variam de 70% a 90%, dependendo da pressão da doença e da sensibilidade do híbrido. Os danos causados pela praga já são evidentes no Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e nos Estados Unidos.
Na Argentina, por exemplo, a cigarrinha causou uma perda de 40% na última safra. Nos Estados Unidos, há um esforço crescente de pesquisa para conter seu avanço, especialmente em estados como Flórida e Oklahoma, antes que a praga chegue ao cinturão do milho. No Brasil, a cigarrinha-do-milho continua se espalhando rapidamente pelo território.
No Triângulo Mineiro os ataques estão severos. No Rio Grande do Sul, em Minas Gerais e Goiás, há vários registros de efeitos nocivos da cigarrinha. Principalmente nas áreas do país onde se estabelecem “pontes verdes” (plantio de milho o ano inteiro), a população da praga e as doenças que ela transmite se mostram hoje altamente representativas.
O principal impacto da praga é a redução da formação do grão de milho, resultando em grãos de menor peso e qualidade, além de plantas mais baixas e com aparência “enfezada”. Em casos extremos, os grãos podem murchar a ponto de não serem pressionados pelas palhas, permitindo a entrada de água e causando pré-germinação. Isso gera prejuízos adicionais, como “descontos” na entrega e comercialização do milho.
Anteriormente, avaliavam-se resultados de produtos somente na fase adulta da cigarrinha. Entretanto, os pesquisadores constataram que o correto é priorizar também o controle na fase ninfal, em que a praga se multiplica rapidamente no sistema agrícola e perpetua a espécie. As ninfas vivem embaixo da folha, com baixíssima mobilidade na planta, protegidas, sobrevivendo em grandes proporções e sempre aumentando suas populações.
Os enfezamentos são doenças que afetam plantas, especialmente o milho, e são causados por diferentes tipos de bactérias. Existem dois principais tipos de enfezamento: o enfezamento-pálido e o enfezamento-vermelho.
O enfezamento-pálido é causado pelo espiroplasma, um tipo de bactéria em forma de espiral. As plantas afetadas por esta doença apresentam sintomas como clorose (amarelecimento das folhas), redução do crescimento e produção, além de um enfraquecimento geral. O espiroplasma é transmitido por insetos vetores, principalmente a cigarrinha Dalbulus maidis, que ao se alimentar da seiva da planta, espalha a bactéria de uma planta infectada para uma planta saudável.
Por outro lado, o enfezamento-vermelho é causado por fitoplasma, que é outro tipo de bactéria, mas sem uma forma definida e que vive dentro das células das plantas. As plantas infectadas pelo fitoplasma apresentam sintomas como a coloração vermelha ou arroxeada das folhas, também podendo ocorrer a diminuição do crescimento e produção, deformações nas folhas e esterilidade das espigas. Assim como o espiroplasma, o fitoplasma é transmitido por insetos vetores, sendo a cigarrinha Dalbulus maidis um dos principais responsáveis pela disseminação da doença.
Ambos os tipos de enfezamento causam sérios prejuízos à cultura e o controle dessas doenças envolve o manejo adequado dos vetores, o uso de variedades resistentes e práticas agrícolas que diminuam a incidência desses patógenos.
O ciclo de vida da cigarrinha do milho, desde o ovo até o adulto, dura aproximadamente 25 dias. A longevidade do inseto adulto varia, vivendo em média 50 dias, mas podendo chegar a até 110 dias em algumas condições. Durante sua vida, a cigarrinha pode migrar grandes distâncias, inclusive de um talhão para outro, levando consigo os patógenos e transmitindo a doença a novas plantas de milho.
Quando uma cigarrinha infectada se alimenta de uma planta de milho saudável, ela transmite os patógenos para a nova planta, reiniciando o ciclo da doença. A cigarrinha, uma vez contaminada, continua sendo um vetor de transmissão durante toda a sua vida. Este processo pode resultar em infecções generalizadas em plantações de milho.
A temperatura e a disponibilidade de plantas hospedeiras são fatores que influenciam a população da cigarrinha do milho. Em ambientes favoráveis, onde a temperatura é ideal e há abundância de plantas hospedeiras, a população de cigarrinhas pode explodir, aumentando a disseminação dos patógenos e a incidência do enfezamento.
Estratégias de controle e manejo integrado
1. Monitoramento e Identificação – o primeiro passo para o controle eficaz da cigarrinha do milho é o monitoramento constante das áreas cultivadas. Detectar precocemente a presença da praga e seus sintomas ajuda na tomada de decisões rápidas e eficientes. A agricultura de precisão pode desempenhar um papel crucial no combate ao enfezamento do milho, proporcionando ferramentas e técnicas avançadas para monitorar, analisar e gerenciar plantações de forma mais eficaz. O uso de armadilhas para insetos é recomendável que devem ser trocadas semanalmente, observando-se a quantidade de cigarrinhas apreendidas, para acompanhar a evolução da população do inseto na lavoura. Bastam duas armadilhas por hectare, instaladas nas bordas das lavouras. Também é recomendado que o agricultor instale armadilhas voltadas para o terreno do vizinho, caso ele também plante milho.
2. Uso de cultivares resistentes – a seleção de cultivares de milho geneticamente resistentes ao enfezamento é uma estratégia promissora. Pesquisas têm demonstrado que variedades resistentes podem reduzir significativamente os danos causados pela doença. A Embrapa tem desenvolvido e testado diversas variedades de milho resistentes ao enfezamento-pálido e enfezamento-vermelho. Em testes de campo, essas variedades mostraram uma redução significativa na incidência de doenças e um aumento na produtividade em comparação com variedades suscetíveis.
3. Manejo cultural – práticas como rotação de culturas, manejo adequado da adubação e época de plantio podem influenciar na incidência da cigarrinha do milho. O manejo integrado de pragas (MIP) inclui também a adoção de técnicas que promovam a biodiversidade na área cultivada, reduzindo assim a pressão das pragas.
4. Controle do milho voluntário – todos os produtores rurais também devem estar atentos ao manejo de entressafra, com relação ao surgimento e erradicação do milho voluntário ou milho tiguera. Essas plantas são frequentemente observadas em áreas produtivas e podem favorecer a permanência dos patógenos e do vetor, sendo fonte de inóculo desses e outros patógenos. Assim a manutenção de plantas de milho nas áreas de lavoura é condição favorável para permanência dos patógenos e do vetor. Daí a importância de quebra do ciclo biológico da cigarrinha e da ponte verde na cultura. É importante o agricultor realizar monitoramentos constantes na entressafra do milho para identificar presença de plantas tiguera e eliminá-las antes da nova semeadura. E, no caso do aumento da incidência de cigarrinhas, adotar o controle químico já no início da lavoura.
5. Controle químico – em casos severos, o controle químico no início da lavoura pode ser necessário. No entanto, é fundamental que seja realizado de forma racional e seguindo as recomendações técnicas para minimizar impactos ambientais e evitar resistência das pragas aos defensivos agrícolas.
O controle da cigarrinha do milho e do enfezamento é crucial não apenas para garantir a sustentabilidade e a rentabilidade das lavouras, mas também para preservar a posição de destaque do Brasil como um dos principais produtores de milho globalmente. A implementação de práticas de manejo integrado, aliada à pesquisa contínua e ao desenvolvimento de cultivares resistentes, são passos fundamentais para enfrentar os desafios fitossanitários que ameaçam a cultura do milho.