CAMPING -  Dicas para escolher a barraca ideal

O projeto prevê fincar 180 árvores fake nos parques lineares da Doca e da Tamandaré, que antes eram canais e recebiam esgotos - Foto: Márcio Nagano/Sumaúma

O sistema considerado controverso por ambientalistas, paisagistas e entre a população civil, mistura trepadeiras com material reciclado. Originalmente foi nomeado de “árvores artificiais” ou “ecoárvores” pelo governo paraense, causou polêmica nas redes sociais e depois das críticas, a gestão de Helder Barbalho (MDB) precisou trocar o nome de suas árvores fictícias para “jardins suspensos”, já que o eco que ressoa, de fato, é mesmo o da falta de árvores reais. O governo alega que a solução artificial foi necessária porque a faixa de terra ao longo dos canais é rasa em muitas partes, inviável plantar árvores reais por falta de espaço para raízes ou pela disponibilidade do solo e as raízes das árvores precisam de profundidade e de espaço lateral para que cresçam saudáveis.

Paisagistas enxergam como um equívoco, ou pelo menos uma solução questionável do ponto de vista estético e ambiental, a inserção de “gaiolas de metal” com plantas, em alguns casos, estrangeiras, exóticas invasoras, reconhecidas pela ciência, sendo usadas nessas árvores, como a Tradescantia zebrina, uma espécie típica do sul da América Central e que é uma importante invasora da Mata Atlântica e que se cair na água de um rio na frente, por exemplo, pode também contaminar a floresta amazônica.

A ideia de aproveitar materiais descartados em estruturas para fins paisagísticos é interessante, mas a de fixar ervas ornamentais para simular a copa de árvores é bizarra. Mais ainda se forem considerados que não farão isso numa região desértica, mas na de maior biodiversidade do país, reclamam especialistas, que criticam também a sombra insuficiente que não contempla mais do que os próprios canteiros. Para muitos chega a ser caricato, pois o Brasil possui espécies de arbustos nativos do bioma amazônico ou mesmo exóticos bem adaptados cujas raízes não são profundas e, portanto, jamais afetariam tubulações enterradas de infraestrutura ou os pavimentos, além de apresentar boa cobertura vegetal proporcionando bom sombreamento e proteção.

Estruturas de vergalhão que simulam árvores estão sendo instaladas em parques lineares preparados para a COP30 em Belém - Foto: Márcio Nagano/Sumaúma
Estruturas de vergalhão que simulam árvores estão sendo instaladas em parques
lineares preparados para a COP30 em Belém – Foto: Márcio Nagano/Sumaúma

Árvores coloridas despontam no primeiro trecho do novo Parque Linear da Doca, construído em Belém como uma das melhorias planejadas para a COP30. Mais de perto, é possível entender por que elas são tão diferentes das que geralmente brotam do chão. Seus caules, na verdade, são vergalhões de ferro, sobra de material usado em obras da cidade. E estão cobertos por trepadeiras, que serpenteiam até chegar a uma copa formada por vasos de plantas. São árvores fake, ou seja, árvores que imitam árvores, criadas em uma cidade pouco arborizada e que desmatou ainda mais para abrir espaço para receber o evento de clima da ONU.

As ecoárvores pelo governo do Pará são a nova polêmica antiambiental que envolve a chegada da COP30 a Belém. O governo tem, desde o ano passado, derrubado áreas de floresta para fazer obras que abrem espaço para a circulação de carros na capital do estado e violam direitos de populações tradicionais na região metropolitana. A cidade que sediará a COP30 em novembro foi a quinta capital brasileira que mais perdeu vegetação urbana entre 2003 e 2023, com mais de 500 hectares, de acordo com o MapBiomas. Especialistas avaliam que para áreas urbanas, isso é muito, é dramática a situação de arborização e proteção das áreas verdes em Belém e na região metropolitana. Seja por falta de políticas públicas efetivas, seja pela pressão de grandes empreendimentos, que trazem junto uma especulação imobiliária nessas áreas.

A área projetada para o complexo turístico e de lazer composto pelo Parque Linear da Doca, Porto Futuro, Estação das Docas e Boulevard Gastronômico de Belém
A área projetada para o complexo turístico e de lazer composto pelo Parque Linear
da Doca, Porto Futuro, Estação das Docas e Boulevard Gastronômico de Belém
A primeira quadra do Parque Linear da Doca é entregue, restando 7 trechos - Foto: Vinicius Pinto/Agência Pará
A primeira quadra do Parque Linear da Doca é entregue, restando 7 trechos
Foto: Vinicius Pinto/Agência Pará
Vista aérea do primeiro trecho da Doca liberado em Belém - Foto: Raphael Luz/Agência Pará
Vista aérea do primeiro trecho da Doca liberado em Belém – Foto: Raphael Luz/Agência Pará

O governo pretende fincar 80 árvores artificiais no Parque Linear da Doca, que recebe aporte financeiro de Itaipu Binacional, e mais 100 no Parque Linear da Tamandaré, financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Sem detalhar as espécies, outras 250 árvores (de verdade) também serão plantadas nos locais. Doca e Tamandaré eram dois corpos de água que a urbanização sufocante cimentou, transformou em canais e despejou esgoto. Agora, na preparação da cidade para a COP30, vão virar parques, e a solução paisagística celebrada pelo poder público foi pendurar plantas em estruturas de metal nesses locais. Ambas as obras são parques lineares, com quiosques, jardins, áreas contemplativas, espaço para eventos, playgrounds, academia ao ar livre e ciclovias.

Os gestores públicos afirmam que mesmo se plantando árvores reais nos locais, consideram as árvores artificiais “ecológicas” pois os vergalhões foram reaproveitados. A arquiteta responsável pelo projeto, Naira Carvalho, da Secretaria de Obras Públicas do Pará, diz que a inspiração veio é o projeto Supertrees Grove, um grandioso complexo arquitetônico futurista com elementos da natureza localizado na Marina Bay, em Singapura, no sudeste asiático – que, diferentemente da versão paraense, as “árvores” atuam como exaustoras de ar, coletoras de energia solar e de água da chuva – e alega que a “ecoárvore” traz os benefícios de uma árvore natural, justificando que as estruturas vão fornecer sombra e conforto nos locais onde é inviável plantar árvores reais por falta de espaço para raízes ou pela disponibilidade do solo. Mas especialistas contestam alegando que não é porque está fazendo reaproveitamento de material que é efetivamente ecológica. Existem vários serviços ecológicos prestados por uma árvore, tais como a sombra, o fruto, a irrigação, o filtro de ar e não se pode dizer que é ecológica quando uma árvore anula vários desses elementos e só faz sombra.

A justificativa da arquiteta da Seop-PA responsável pelo projeto, Naira Carvalho, é de que as estruturas vão fornecer sombra e conforto nos locais onde é inviável plantar árvores reais por falta de espaço para raízes ou pela disponibilidade do solo. A idealizadora e o "jardim suspenso" - Foto: Leonardo Macêdo/Seop
A justificativa da arquiteta da Seop-PA responsável pelo projeto, Naira Carvalho, é de
que as estruturas vão fornecer sombra e conforto nos locais onde é inviável plantar
árvores reais por falta de espaço para raízes ou pela disponibilidade do solo.
A idealizadora e o “jardim suspenso” – Foto: Leonardo Macêdo/Seop

O projeto das super árvores de Singapura no qual a arquiteta Naira Carvalho se inspirou para desenvolver os jardins suspensos de Belém, reúne doze “árvores artificiais” gigantescas que funcionam como jardins verticais. As estruturas têm entre 25 e 50 metros de altura, o equivalente a um edifício de 16 andares. Elas possuem:

  • Iluminação: à noite, as “super árvores” se acendem com luzes de LED coloridas. O momento é chamado de “Garden Rhapsody”;
  • Geração de energia: algumas possuem painéis solares para gerar energia e sistemas de captação de água da chuva para irrigação;
  • Jardins verticais: as estruturas são cobertas por mais de 163 mil plantas de 200 espécies diferentes, incluindo orquídeas e samambaias;
  • Passarela: uma ponte suspensa chamada “OCBC Skyway” conecta algumas “árvores”, o que permite uma vista panorâmica da cidade.

Já em Belém, os jardins suspensos inspirados no Supertrees Grove possuem cerca de 2,5 metros, sem as mesmas utilidades e alternativas sustentáveis. Para os críticos, a projetista resolveu adotar a solução absurda e excêntrica “inspirada em Singapura” com os vergalhões, quando árvores dariam benefícios muito maiores do que uma imitação de árvore, de plástico ou não, além do que existem diferenças climáticas e ambientais entre Singapura, na Ásia, e Belém, na Amazônia.

As árvores fake do governo do Pará são inspiradas nas "supertrees" de Singapura (Supertrees Grove), mas não têm os atributos ecológicos - Foto: Shiny Things/Wikimedia Commons
As árvores fake do governo do Pará são inspiradas nas “supertrees” de
Singapura (Supertrees Grove), mas não têm os atributos ecológicos
Foto: Shiny Things/Wikimedia Commons

Segundo avaliação do coletivo Cop do Povo, uma coalizão de ONGs que organiza eventos paralelos para a conferência, pelo perfil nas redes sociais, afirmou que “em plena amazônia, o governo do Pará resolveu plantar árvores artificiais para fornecer sombra e ventilação aos participantes do evento internacional. Centenas de alternativas poderiam ser encontradas para tal tarefa, bastava consultar as comunidades tradicionais e os povos originários da região, mas isso não foi feito”. Para o grupo é preocupante o grau de desconexão com a realidade amazônica e o desalinhamento com diretrizes dos principais acordos ambientais internacionais. O simbolismo de implantar árvores artificiais em uma das regiões mais biodiversas do planeta escancara não só o desprezo pelo conhecimento tradicional e científico sobre o bioma amazônico, mas também a falta de escuta e diálogo com as comunidades locais, ribeirinhas e os povos originários.

Segundo especialistas, o conceito “parque linear” foi vulgarizado. Há anos o termo é usado como se significasse tratar uma área urbanizada linearmente, como uma faixa estreita em torno de um pequeno rio urbano. Mas não deveria ser assim. Um parque linear deveria, no mínimo, recuperar parte da vegetação da área denominada “várzea imediata”. Na cidade que vai receber o principal evento do mundo para discutir mudanças climáticas e preservação ambiental, as estratégias utilizadas nas construções podem ser o reflexo da falta de pensar a Amazônia pelos aspectos da própria região. O tal “jardim suspenso” tem uma capacidade muito limitada de capturar carbono. Além disso, enfrenta problemas de manutenção complexa e um custo extremamente alto, o que torna o investimento pouco viável.

O que deveria ser feito era priorizar o plantio de árvores e arbustos. As árvores são centrais para a recuperação ambiental urbana, porque controlam a umidade do ar e solo, retêm partículas poluentes e atraem fauna, o que ajuda a manter o solo fértil e úmido. Tudo isso revela uma contradição, pois não se trata apenas de construir suporte para plantas trepadeiras proporcionarem sombra, mas de reproduzir certas condições do ambiente na interação entre vegetação, fauna, solo, água e ar. Técnicos são categóricos em afirmar que as árvores reais trazem muito mais benefícios do que os “jardins suspensos” e têm menor impacto negativo na biodiversidade urbana, enquanto os “jardins suspensos”, só pela instalação e materiais, já representam um gasto tão elevado que não compensa.

Uma das 180 árvores fake nos parques lineares da Doca e da Tamandaré vista de cima. Pouca área de sombra - Foto: Márcio Nagano/Sumaúma
Uma das 180 árvores fake nos parques lineares da Doca e da Tamandaré
vista de cima. Pouca área de sombra – Foto: Márcio Nagano/Sumaúma

Entre as obras recentes, algumas delas para atender ao fluxo de pessoas do evento da ONU, o governo está abrindo na região metropolitana da capital duas novas vias: a Avenida Liberdade e a Rua da Marinha. Para viabilizar a primeira, propôs a derrubada de 68 hectares de uma área onde antes havia floresta. Na segunda, quase 35 hectares de árvores foram ao chão. A falta de árvores é sentida no cotidiano de Belém. No ano passado, em novembro, mesmo mês em que acontecerá a COP30, a média da temperatura máxima foi de 35,9°C, com pico de 37,9°C, o maior registrado em 102 anos, desde o início da série histórica de dados.

Além de derrubarem árvores, o prolongamento e a duplicação da Rua da Marinha, com extensão de 3,5 quilômetros e financiamento do BNDES, também causaram danos ambientais ao Parque Ecológico do Município de Belém Gunnar Vingren, segundo o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA). Em setembro de 2024, o órgão entrou na Justiça com uma ação civil pública em que pedia a suspensão imediata das obras por falta de licenciamento ambiental municipal, estudo de impacto ambiental e consulta pública. O município de Belém e a Associação dos Moradores do Conjunto Médici, que fica próximo à via, se manifestaram no processo contra a expansão. A obra foi suspensa sob pena de multa diária de 100 mil reais. Oito dias depois, diante da alegação da Procuradoria-Geral do Estado de que a paralisação causaria impacto na realização da COP30 e no financiamento do BNDES, o desembargador Roberto de Moura, sem analisar o mérito da ação, suspendeu a liminar. O governo do estado afirma que houve licenciamento e acompanha os impactos ambientais da área. Segundo o jornal Folha de S.Paulo, o BNDES nega que já tenha liberado o empréstimo.

A Rua da Marinha, que está sendo duplicada e ampliada, passa ao lado de um paqrque ecológico municipal - Foto: Márcio Nagano/Sumaúma
A Rua da Marinha, que está sendo duplicada e ampliada, passa ao lado
de um paqrque ecológico municipal – Foto: Márcio Nagano/Sumaúma
Quase 35 hectares de vegetação foram derrubados para a construção da Rua da Marinha, uma das obras de mobilidade para a COP30 - Foto: Márcio Nagano/Sumaúma
Quase 35 hectares de vegetação foram derrubados para a construção
da Rua da Marinha, uma das obras de mobilidade para a COP30
Foto: Márcio Nagano/Sumaúma

Já a Avenida Liberdade é uma via intermunicipal de 13,3 quilômetros que vai de Belém a Alça Viária, em Marituba, passando ainda pelo município de Ananindeua. No caminho, a estrada atravessa a Área de Proteção Ambiental da Região Metropolitana (APA Belém) e o Refúgio de Vida Silvestre Metrópole da Amazônia. Também passa perto do Parque Estadual do Utinga, unidade de conservação estadual onde ficam os lagos Água Preta e Bolonha, que abastecem Belém. O Parque do Utinga, que antes vinha mantendo sua área de floresta preservada, está ameaçado. Com a Avenida Liberdade, o parque pode sofrer um processo de degradação ambiental, colocando em risco, além da fauna e da flora, os recursos hídricos. O Relatório de Impacto Ambiental da Avenida Liberdade identificou três espécies vegetais ameaçadas de extinção na área de influência do projeto e quatro espécies de aves vulneráveis ou quase ameaçadas de extinção. O governo do Pará, no entanto, afirma que a avenida está sendo construída em uma área já habitada, em que o traçado acompanha um linhão de energia, seguindo a faixa onde a vegetação foi anteriormente suprimida. Também disse que a obra já estava prevista antes da COP30 e que todas as ações de mitigação dos impactos nos corpos d’água e nas áreas direta e indiretamente afetadas estão previstas no Plano de Controle Ambiental.

A avenida Liberdade rasga, ainda, as proximidades do Quilombo Abacatal, em Ananindeua, que resiste há mais de 300 anos, apesar da pressão de lixões, linhões e outras formas de sufocamento do território causadas pelo mundo urbano. Segundo representantes do quilombo, o governo não respeitou a consulta nem as compensações prometidas à comunidade. O governo nega. Muitos quilombolas vivem do extrativismo, vivem da pesca, vivem da caça e com o desmatamento ao redor da comunidade tudo isso fica prejudicado correndo o risco de se extinguir.

Av. Liberdade impactou um quilombo e três áreas protegidas - Foto: Adriano Machado/Reuters
Av. Liberdade impactou um quilombo e três áreas protegidas
Foto: Adriano Machado/Reuters

O legado de obras como a da Avenida Liberdade para o Quilombo Abacatal e toda a gente da região metropolitana de Belém tende a ser o agravamento dos processos locais de mudança climática. Quando se soma o aumento de áreas impermeabilizadas, a tendência vai ser aumentar as ilhas de calor e os alagamentos. Em nota, o governo do Pará diz que a obra impactará positivamente a qualidade de vida de cerca de 2 milhões de pessoas, alegando que a redução do tempo médio de deslocamento no trânsito representa qualidade de vida, além de resultar na redução de 17,7 mil toneladas de CO2 por ano, contribuindo para a diminuição da emissão de combustíveis fósseis provenientes de veículos. Garante ainda que está implementando diversas soluções estratégicas para assegurar a sustentabilidade da via, incluindo a construção de ciclovias, a utilização de energia solar para sua iluminação e a implantação de 34 passagens de vida silvestre ao longo do percurso para permitir o livre tráfego da fauna local.

O que ainda garante respiro à floresta em Belém são algumas de suas ilhas. Na área continental da cidade, a vegetação urbana sofre para seguir viva. A derrubada de árvores dos canteiros centrais da Avenida Rômulo Maiorana, antiga Avenida 25 de Setembro, é outra que tem preocupado pessoas que vivem no entorno. Desde 2022, integrantes do Coletivo Canteiros Verdes, Cidade Viva participam de reuniões com a prefeitura de Belém sobre o projeto de reurbanização da via. Após questionamentos do coletivo, a administração municipal informou aos moradores que 80% da arborização seria mantida e que, para cada árvore que precisasse ser retirada, seriam plantadas três no lugar.

A empresa responsável pela obra e a prefeitura não dão explicações a quem vive ali sobre a previsão do replantio de árvores em substituição às que foram arrancadas. Enquanto faltam árvores, sobra angústia climática. O sentimento da comunidade é de angústia diante da possibilidade de a gestão pública não fazer um replantio adequado que reforce a via como um corredor verde. Parece que as autoridades não conseguem enxergar a carga simbólica em pleno ano de COP30 em Belém. Para a comunidade, isso, certamente, seria um marketing político muito melhor do que o recurso enganoso que recebeu o nome de “ecoárvore”.

Na obra da Avenida Rômulo Maiorana, os moradores denunciam e a prefeitura reconhece que houve corte excessivo de árvores. Foto: Márcio Nagano/Sumaúma
Na obra da Avenida Rômulo Maiorana, os moradores denunciam e a prefeitura
reconhece que houve corte excessivo de árvores. Foto: Márcio Nagano/Sumaúma

Desde janeiro, o prefeito de Belém é Igor Normando, primo de segundo grau do governador do Pará, Helder Barbalho, ambos do MDB. Sumaúma questionou a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma) sobre o cumprimento do que fora acordado pela administração anterior, de Edmilson Rodrigues, do PSOL, e pediu um detalhamento do número de árvores derrubadas e do número de árvores plantadas na Avenida 25 de Setembro, como ainda é chamada na cidade. A Semma respondeu que realizou vistoria no local, constatou que de fato houve retirada excessiva de vegetação e está tomando providências para garantir o cumprimento das condicionantes.

Pesquisadores da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), em um acordo de cooperação com a Semma, que segue até 2028, fazem, desde 2022, um levantamento florístico dos bairros de Belém. As árvores são identificadas por espécie, passam por avaliação de saúde e de risco de queda. Os problemas da urbanização que as afetam também são avaliados. Os pesquisadores fazem ainda um mapeamento por GPS dos indivíduos, que é como eles chamam as árvores. Esse mapa é repassado à Secretaria Municipal. O trabalho já inventariou a arborização de quatro bairros de Belém.

O levantamento mostra que Belém realmente necessita de muita arborização. Muitas árvores precisam ser plantadas para que se comece a ter um melhor conforto térmico. Se isso não for feito de imediato, a população sofrerá com consequências muito graves de temperatura.

Belém está perdendo as poucas áreas verdes para que em seu lugar passem asfalto, carros e as obras da COP30 - Foto: Márcio Nagano/Sumaúma
Belém está perdendo as poucas áreas verdes para que em seu lugar passem
asfalto, carros e as obras da COP30 – Foto: Márcio Nagano/Sumaúma

A verdade é que a cidade que é a porta de entrada da amazônia precisa de árvores verdadeiras, que conseguem ter durabilidade, capacidade de equilíbrio ecológico, proporcionam a diminuição da temperatura, aumentam a umidade do ar, seguram barulho, poluição, poeira, chuva, formam chuvas, tudo aquilo que as águas proporcionam. Belém já foi reconhecida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) como uma das capitais menos arborizadas do Brasil, com apenas 22,4% de arborização, mesmo que tenha como apelido histórico “cidade das mangueiras” devido os corredores dessas árvores que existem no centro da cidade, instaladas no período áureo da borracha, final do século XIX, para refrescar a elite local. Em paralelo, a cidade sofre com quedas de árvores centenárias, principalmente no inverno amazônico, quando aumentam as chuvas fortes.

A realidade de rios e igarapés aterrados ou com matas ciliares removidas para dar lugar a beiradas cimentadas, embora não sejam um problema exclusivo das cidades amazônicas, são um desafio maior para a região devido à importância simbólica da defesa desse bioma na atual conjuntura. Pela grandiosidade do ecossistema, aterrar e cimentar beiradas de rios tem um impacto muito maior em relação às cidades da região. Historicamente, para se ter uma cidade moderna na amazônia é necessário vencer os obstáculos da natureza, com a retirada da cobertura vegetal da floresta e o aterramento do rio. No início do século XX, final do século XIX, criou-se uma narrativa de que rios, igarapés e demais corpos hídricos seriam lugar de atraso e de proliferação de doenças. Por isso hoje, em um contexto de racismo ambiental, a maioria dos canais está localizada em territórios periféricos, e após intervenção de macrodrenagem tiveram as matas ciliares removidas, substituídas por concreto.

Boa parte dos moradores dessas áreas são oriundos de cidades do interior, territórios ribeirinhos. Ao ter acesso a esses espaços na capital, mantinham relação com os rios diante de suas casas, usufruindo de plantas medicinais, frutíferas ou pescando. Com o passar dos anos, a poluição e a concretagem removeram dessas pessoas o direito a essa relação. Parte disso é culpa de uma cidade que cresce sem ouvir a população. Assim a cidade se transformou numa cidade de pedra, como se chama. Há uma disputa desse pensamento de preservação das florestas, dos igarapés, com a visão do setor empresarial imobiliário.

Túnel de mangueiras na Praça da República em Belém. Queda de árvores centenárias na sede da COP 30 expõe urbanização desordenada e efeitos da crise climática - Foto: Everaldo Nascimento/O Liberal
Túnel de mangueiras na Praça da República em Belém. Queda de árvores centenárias
na sede da COP 30 expõe urbanização desordenada e efeitos da crise climática
Foto: Everaldo Nascimento/O Liberal

Às vésperas da COP30, após o governo já ter destinado mais de R$ 4 bilhões para obras na Região Metropolitana de Belém, a prefeitura municipal da capital paraense está iniciando o processo de revisão do Plano Diretor. A falta de escuta da população das favelas gera o que os moradores da Vila da Barca estão denunciando como segregação da COP30, após o governo. O bairro, que sofre com falta de políticas públicas em diferentes áreas, está localizado próximo à Doca, um dos metros quadrados mais caros da cidade, que atualmente recebe obras de embelezamento para o evento.

Os moradores apontam também para o fato de que a Vila da Barca recebe os rejeitos das obras do parque, além de ser o local por onde está passando o esgotamento sanitário oriundo da região. Para os privilegiados, o parque linear, para carentes, nada mais do que o cocô da Doca. Na Vila da Barca, onde há mais de cem anos os mais necessitados resistem para permanecer no território, décadas e décadas depois, são atacados de alguma forma, dessa vez com os dejetos que virão da área nobre de Belém.

A capital do estado tem perdido muitas de suas árvores-símbolo, as mangueiras, adoecidas pelo domínio do concreto e do asfalto. As raízes dessas plantas vêm sofrendo ataques. Foram retiradas muitas raízes para fazer pavimentação, o que está causando um encharcamento do solo. Elas estão apodrecendo e não estão se expandindo, não estão segurando, suportando o peso da árvore. Pesquisadores consideram importante diversificar as espécies, plantando em cada bairro árvores adequadas à diferentes áreas.

Uma das mangueiras danificadas mapeadas com risco de queda
Uma das mangueiras danificadas mapeadas com risco de queda
Uma velha mangueira caiu, obstruiu a via pública e foi retirada por servidores da Secretaria de Municipal de Meio Ambiente (Semma) de Belém
Uma velha mangueira caiu, obstruiu a via pública e foi retirada por servidores
da Secretaria de Municipal de Meio Ambiente (Semma) de Belém

A trágica ironia das árvores fake é a solução artificial pensada como alternativa em uma cidade que precisa, e muito, de árvores reais. Enquanto, de um lado, se perde arborização, áreas verdes pelas obras, de outro, se apresenta uma árvore que praticamente não tem qualquer função ecológica. As árvores fake revelam uma desconexão com a amazônia e uma afronta aos marcos globais de ação climática.

Segundo os responsável do Programa Cidades Verdes Resilientes, do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), plantas trepadeiras devem ser associadas preferencialmente a estruturas já existentes, que têm de ser utilizadas como intervenção complementar a outras ações para ampliar a vegetação urbana, e que árvores nativas geram mais benefícios que outras formas de vida vegetais, contribuindo com a redução da temperatura e a promoção da biodiversidade.

Fonte: Sumaúma

Leia também: