Vespa é a primeira descrita a parasitar moscas-das-frutas nessa fase e o achado abre oportunidades de pesquisa, com possibilidade de uso como controle biológico de pragas
Pesquisadores norte-americanos da Mississippi State University (MSU) identificaram uma nova espécie de vespa parasitoide que ataca e se desenvolve dentro de moscas adultas de diferentes espécies de moscas-das-frutas, do gênero Drosophila. A descoberta representa uma novidade no campo da biologia, pois, até então, não havia registro de espécies que parasitassem o estágio adulto de moscas, como a amplamente estudada Drosophila melanogaster, espécie-chave em pesquisas científicas. A descoberta foi registrada em um artigo na revista Nature.
Encontrada de forma inesperada durante o estudo de moscas coletadas em quintais do estado do Mississippi, nos Estados Unidos, em 2023, a descoberta revela que essa nova espécie de vespa, denominada Syntretus perlmani, infecta as moscas adultas por meio da postura de ovos dentro de seus corpos. O ciclo de vida da vespa inicia-se com fêmea utilizando o seu ferrão para introduzir seus ovos no corpo da mosca. Ao picar o hospedeiro, ela alcança o abdômen e deposita os ovos. As larvas se desenvolvem formando algo semelhante a um segundo organismo e rompem o abdômen da mosca, em um processo que dura cerca de 18 dias, matando o hospedeiro.
O parasitismo em adultos, conhecido como “imagobiose”, é uma estratégia rara entre os insetos, especialmente entre as vespas parasitoides. Normalmente, essas espécies atacam larvas ou pupas de outros insetos. No entanto, S. perlmani segue uma linha evolutiva distinta, pertencendo ao grupo Euphorinae, uma subfamília de vespas braconídeas conhecidas por sua capacidade de infectar adultos de outros insetos, como besouros e formigas.
Embora existam registros de vespas que atacam adultos de outros insetos, esta é a primeira vez que se observa esse comportamento em moscas do gênero Drosophila. Isso amplia a compreensão sobre a biodiversidade e a especialização de vespas parasitoides, abrindo novas possibilidades de estudo sobre como esses organismos evoluem para enfrentar os desafios de infectar hospedeiros adultos, que tendem a ser mais móveis e resistentes do que suas formas juvenis.
Drosophila melanogaster é uma das principais espécies modelo em estudos genéticos e biológicos há mais de um século. Por isso, a descoberta de uma vespa que a parasita em seu estágio adulto pode ter implicações profundas nas pesquisas futuras, sobretudo na compreensão de interações parasita-hospedeiro, imunidade, metabolismo e comportamento. Segundo os pesquisadores, o fato de S. perlmani usar uma espécie tão amplamente estudada como hospedeiro pode fornecer novos insights sobre mecanismos imunológicos e ecológicos.
Além disso, a nova vespa parasitoide pode auxiliar em estudos sobre a evolução de respostas imunológicas em diferentes estágios de desenvolvimento dos insetos. Como D. melanogaster é uma espécie de fácil manipulação genética, isso possibilita experimentos controlados sobre como esses insetos reagem ao ataque de parasitoides adultos.
Segundo Matthew Ballinger, autor do artigo, todas as vespas parasitoides de moscas conhecidas atacam e se desenvolvem em estágios de vida imaturos. Apesar de 200 anos de pesquisa sobre vespas parasitoides de Drosophila e outras moscas, nunca foi encontrada uma espécie que atacasse o estágio adulto, até o momento. Isso faz com que as predadoras sejam comumente usadas como um controle biológico natural de pragas.
A nova espécie de vespa foi coletada em armadilhas com iscas de frutas em ambientes rurais e suburbanos. As infecções por S. perlmani foram observadas em menos de 1% dos machos da espécie Drosophila affinis, coletados entre março de 2023 e fevereiro de 2024. Embora a taxa de infecção seja baixa, os cientistas ressaltam que ela varia ao longo do ano e de acordo com a abundância de hospedeiros.
Ao analisar amostras de DNA de moscas selvagens, os pesquisadores também encontraram sinais de S. perlmani em moscas D. melanogaster capturadas nos estados da Geórgia, Virgínia, Pensilvânia e Illinois. Isso sugere que a vespa pode ter uma distribuição mais ampla do que se imaginava inicialmente, com a possibilidade de parasitar diversas espécies de Drosophila.