A dieta contendo a planta Artemisia annua para a tilápia-do-Nilo modificou a microbiota intestinal dos peixes e melhorou a sua imunidade
Estudos desenvolvidos por cientistas da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Embrapa Meio Ambiente (SP) concluíram que a dieta contendo a planta Artemisia annua para a tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus) modificou a microbiota intestinal dos peixes, promovendo maior ganho de peso e melhora na imunidade. A pesquisa abre caminhos para a formulação de rações para peixes que usem a planta como ingrediente oferecendo ao setor um novo bioproduto. Originária das regiões temperadas da Ásia, a artemísia é encontrada em todo o mundo.
Há um interesse crescente em estratégias para manipular a microbiota intestinal de peixes e proporcionar uma comunidade benéfica para aumentar o crescimento, melhorar o metabolismo lipídico, estimular a resposta imune e melhorar o estado fisiológico da tilápia. As substâncias fitogênicas, como o extrato de artemísia, são compostos naturais considerados ideais como promotores de crescimento, ao mesmo tempo em que melhoram a morfologia intestinal, garantindo maior eficiência produtiva.
Dentre os aditivos fitogênicos, a Artemisia annua tem se destacado por seu uso na produção animal, melhorando o desempenho de crescimento, morfologia intestinal e capacidade antioxidante de frangos de corte e leitões desmamados. Para peixes, o extrato da planta mostrou potencial considerável como promotor de crescimento para o cultivo de carpas e trutas. A tilápia do Nilo é a espécie mais difundida mundialmente na aquicultura, e a sua popularidade continua aumentando devido aos excelentes resultados produtivos.
Os pesquisadores relatam que os potenciais benefícios da suplementação de Artemisia annua em tilápia do Nilo pelos 30 dias do experimento foram evidentes. Soares explica que o extrato da artemísia modificou as comunidades microbianas intestinais, resultando em uma comunidade mais eficiente e promoveu alterações na morfologia, proporcionando melhor conversão alimentar e eficiência proteica, levando ao ganho de peso e crescimento.
Para peixes cultivados, a alimentação é vital na formação do microbioma do trato gastrointestinal, e a sua diversidade se reflete em ganho de peso, desenvolvimento imunológico, inibição de patógenos e várias atividades metabólicas dos hospedeiros. Os compostos bioativos de plantas podem modular a microbiota do trato intestinal, ao mesmo tempo em que promovem o crescimento de bactérias benéficas. Além disso, a modulação da microbiota inibe o crescimento de bactérias patogênicas (que provocam doenças).
Os pesquisadores sugerem que a suplementação de Artemisia annua, além de atuar como um modulador da microbiota, também desempenha um papel na renovação e maturação do epitélio intestinal, uma vez que proporcionou aumento na altura, perímetro, espessura e relação de vilosidades em intestinos de tilápia. Ambos estão relacionados ao efeito da suplementação de artemísia, que melhorou o desempenho de crescimento da tilápia do Nilo.
O intestino é o principal responsável pela digestão e absorção em peixes. Consequentemente, ele também contribui para o crescimento saudável. As alterações na morfologia intestinal, como vilosidades mais longas e aumento do perímetro das vilosidades, indicam uma maior capacidade de absorção de nutrientes e uma melhor barreira mecânica no intestino dos peixes. A suplementação de Artemisia annua também proporcionou aproveitamento energético eficiente da ração.
Todos os procedimentos envolvendo os animais do estudo foram realizados seguindo princípios éticos em experimentação animal aprovados pelo Comitê de Ética em Experimentação Animal (CEUA) da Embrapa Meio Ambiente. O CEUA segue a Resolução Normativa nº 44, do Guia Brasileiro de Produção, Manutenção e Uso de Animais para Atividades de Ensino ou Pesquisa Científica do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (Concea).
Os resultados permitiram a obtenção de uma patente para os autores da pesquisa, e no momento a Embrapa, em conjunto com a Terpenia Bioinsumos, empresa dedicada ao desenvolvimento de produtos fitogênicos, está trabalhando na obtenção do produto comercial para ser ofertado ao mercado.
A artemísia
Considerada uma planta milagrosa pela ciência, a Artemisia annua é originária da China e seu uso já venceu até o Prêmio Nobel da Medicina. A planta prospera em regiões nas quais as temperaturas médias são elevadas e o nível de precipitação é alto. Para cultivá-la em condições diferentes das ideais é necessário desenvolver projetos de adaptação. Nos últimos anos, o Brasil criou um pacote tecnológico que inclui pesquisas de adaptação climática, produção e atividades farmacológicas da planta.
A Artemisia annua possui componentes voláteis, os óleos essenciais, e não voláteis, sendo o mais relevante deles a artemisinina. O uso da planta e de seus componentes é uma contribuição muito significativa da medicina tradicional chinesa para o mundo, destaque para o uso da artemisinina no tratamento da malária, potente e eficaz para o tratamento inclusive da malária cerebral e da malária falciparum, resistente a múltiplos fármacos. Considerada o principal componente ativo da planta, a artemisinina venceu o Prêmio Nobel da Medicina em 2015.
A produção pesqueira e da aquicultura
A produção de tilápia é a que mais cresce no Brasil, que já é o quarto maior produtor mundial da espécie. Segundo o Anuário da Peixe BR, a tilápia está presente em todas as regiões do País. O protagonismo da espécie na piscicultura vem se confirmando ano a ano no Brasil. Em 2021, foram produzidas 534 mil toneladas no país, um salto de 9,8% ante o ano anterior (486 mil toneladas). Esse resultado representa 63,5% da produção nacional de peixes de cultivo, conforme os dados do Anuário 2022, da Associação Brasileira da Piscicultura (Peixe BR).
Dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) mostram que, em 2018, a pesca e a aquicultura juntas atingiram, em todo o mundo, uma produção de cerca de 179 milhões de toneladas, excluindo a produção de algas. A pesca produziu 96,4 milhões de toneladas e a aquicultura produziu 82,1 milhões de toneladas, mas, ao incluir a produção de algas, a aquicultura atingiu uma produção de 114,5 milhões de toneladas. Esses números confirmam a tendência dos últimos anos do incremento de produção da aquicultura, superando o volume produzido pela pesca.