Para o esporte, lazer ou trabalho, o criador precisa estar atento às infecções na pele do animal, para que não haja prejuízo no rendimento e bem estar
Fisiologicamente, os equinos são animais preparados para fuga, mediante qualquer ameaça, e as feridas ocorrem comumente nessas ocasiões. Lesões cutâneas nos cavalos são comuns na rotina de criadores e podem servir como porta de entrada para doenças graves que afetam a saúde e o bem-estar dos animais, causando perdas produtivas significativas. As feridas são lesões na pele, geralmente produzidas por ação traumática externa, cuja intensidade ultrapassa a resistência dos tecidos atingidos. Tempo de evolução, integridade do suprimento sanguíneo local, grau de contaminação, localização da ferida, perda tecidual, porte do animal, ambiente em que se encontram, custo e efetividade configuram-se como fatores a serem considerados na escolha de estratégias terapêuticas.
Diante disso, há de se considerar, além dos fatores já mencionados, certas particularidades que dificultam a cicatrização, tais como inflamação crônica, exuberante desenvolvimento de tecido cicatricial, lenta epitelização e contração insatisfatória da ferida. Esses ferimentos, pequenos que sejam, podem servir como porta de entrada para uma série de doenças graves que geram perdas produtivas importantes. Entre as patologias mais preocupantes estão a pitiose equina, a habronemose cutânea, sarcóide e carcinoma, todas com potencial de provocar sérios danos aos animais.
A pitiose equina, que acomete animais de qualquer raça, sexo e idade, é uma enfermidade crônica, cosmopolita, de áreas temperadas, tropicais e subtropicais, causada pelo fungo Pythium insidiosum, encontrado em áreas alagadiças e de alta umidade. Os equinos são infectados ao entrar em contato com águas contaminadas, e o fungo utiliza feridas pré-existentes para invadir o organismo, causando lesões progressivas e debilitantes. Com uma intensa reação inflamatória, os animais acometidos pela pitiose equina apresentam lesões cutâneas progressivas, granulosas, ulceradas ou fistuladas localizadas, principalmente, nos membros, abdômen e narinas. Casos clínicos são observados durante todo o ano, mas a maioria coincide com épocas de maior precipitação pluviométrica.
Entre os sinais clínicos mais comuns estão, claudicação, anemia, apatia e perda de peso, fatores que deixam o animal debilitado. Outro sintoma característico é o prurido intenso. Os animais afetados costumam se morder ou buscar locais onde possam coçar a região afetada, o que pode agravar ainda mais a lesão na pele. O curso clínico da doença varia de dias a meses e sua extensão dependerá da evolução das lesões. O tratamento da patologia deverá ser indicado por um médico-veterinário e poderá englobar a higienização da ferida e o uso de medicamentos. O tratamento inclui higienização das feridas e o uso de medicamentos, como anti-inflamatórios e antibióticos. Estudos recentes mostram o uso promissor de Acetonido de triancinolona, um retardoesteroide, no tratamento da pitiose, com resultados positivos na recuperação dos animais, com os animais tratados apresentando tempo de recuperação menor em comparação aos tratamento convencionais.
É importante ressaltar que o criador deverá seguir as indicações do veterinário. Higienizar e manter a lesão protegida é fundamental para proteger a área de sujeiras do ambiente e impedir que o animal faça um novo trauma sobre a ferida, o que pode prejudicar, ainda mais, o quadro.
Outra patologia preocupante é a habronemose cutânea, conhecida como “ferida de verão”, causada pela deposição de larvas de nematódeos (Habronema (majus) microstoma, Habronema muscae e Draschia megastoma). A transmissão ocorre através de moscas (Musca domestica e Stomoxys calcitrans) que depositam as larvas em feridas na pele do animal, com maior ocorrência no verão. Os equinos afetados pela doença ficam mais irritadiços e estressados. Por conta do desconforto, passam a comer menos, o que pode levar a um quadro de anemia ou caquexia (perda contínua de massa muscular, gordura e massa óssea, além de deficiências nutricionais). No caso dos potros a patologia pode trazer prejuízos para o desenvolvimento do animal, prejudicando seu crescimento.
As lesões ocorrem nas regiões do corpo do animal que mais frequentemente atraem as moscas como o canto medial do olho, pênis e prepúcio, além regiões com feridas preexistentes, mais frequentemente em membros. Macroscopicamente, há lesões na pele são de larga extensão variando de 5 a 15 cm de diâmetro, que nunca cicatrizam, com prurido intenso, com superfície ulcerada, que levam os cavalos a morder a área afetada. A realização de biópsia permite a diferenciação da pitiose. A doença causa prurido intenso e feridas que não cicatrizam, afetando o bem-estar dos equinos e podendo levar à perda de valor comercial.
A incidência da patologia é considerada um indício de falha no manejo de vermifugação, no manejo de limpeza e no controle de moscas, por isso ser muito importante um manejo adequado, incluindo a vermifugação regular e o controle de moscas, como medidas essenciais para preveni-la. Vermifugar periodicamente todos os animais da propriedade, quebra o ciclo do parasita. Para isso é fundamental o investimento em um protocolo de vermifugação assertivo. O tratamento envolve ainda cuidados com as lesões, higienização e o uso de medicamentos anti-inflamatórios, antibacterianos, antipruriginosos e fungicidas, com o objetivo de garantir o bem-estar dos equinos e minimizar as perdas produtivas. Em alguns casos pode ser necessária a intervenção química ou cirúrgica na lesão.
O sarcóie é um tumor de pele mais frequente nos equinos e, macroscopicamente, pode ser confundido com pitiose, pois a distribuição das lesões ocorre em locais similares como região distal dos membros, parte ventral do tronco e cabeça. As lesões observadas podem ocorrer nas formas verrucosa, fibroblástica, nodular, oculta e/ou mista. Na forma verrucosa geralmente são lesões pequenas, sésseis ou pedunculadas, com aparência semelhante a couve-flor; na fibroblástica se apresentam como nódulos fibrosos bem circunscritos na derme, geralmente com ulceração da epiderme, predispondo a hemorragias e contaminação secundária, sendo a forma mais frequente; no tipo nodular são massas firmes sob a pele normal; já no oculto se apresentam como áreas circulares, sem pelos e ásperas. Contudo, somente através de biópsia o diagnóstico definitivo pode ser encontrado.
Outra doença que pode ocorrer é o carcinoma de célula escamosas, um tumor maligno, de células epiteliais escamosas, comum em animais domésticos. Os comprometidos geralmente são adultos ou idosos. O tumor tem sido encontrado nos mais diversos sítios, porém cada espécie apresenta estruturas de predileção. Sugere-se que a exposição a radiação solar seja um fator predisponente importante para o desenvolvimento, principalmente quando aliado a despigmentação da pele. Portanto, raças com maior predisposição são aquelas cuja região periocular apresenta despigmentação, como Appaloosa e Paint Horse. Os tumores podem ser erosivos ou proliferativos, apresentando alta vascularização, variando de uma placa de coloração avermelhada à um aspecto de couve flor que geralmente apresenta-se ulcerado. A colheita de material para biópsia, bem como a reunião do histórico animal são de suma importância no diagnóstico diferencial com as demais lesões cutâneas. Devido à elevada ocorrência de feridas em equinos, às particularidades na reparação tecidual nesta espécie e à semelhança macroscópica de algumas lesões, torna-se importante a elaboração de um diagnóstico adequado. A reparação cicatricial inadequada pode resultar, principalmente, em prejuízo econômico por afastamento dos animais da carreira atlética. Entender os princípios e limitações da cicatrização equina contribui para um tratamento efetivo com resultado funcional e com estética favorável.