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Inseto exótico pode causar perdas em reflorestamentos de eucalipto

Eucaliptal

Com mais de 10 milhões de hectares plantados, o Brasil é um dos maiores produtores mundiais de celulose e produtos derivados do setor florestal. De acordo com o último Relatório Anual Ibá – Indústria Brasileira de Árvores, o setor de árvores cultivadas é responsável por R$ 37,9 bilhões do PIB nacional (0,9% do total) e R$ 202 bilhões de receita bruta anual, com US$ 12,7 bilhões em exportações. Além disso, as áreas de florestas cultivadas estocam cerca de 4,92 bilhões de toneladas de CO2eq (dióxido de carbono equivalente, medida internacional para gases com efeito estufa), e 87% da energia consumida vem de fontes renováveis.

No entanto, um dos maiores desafios para o setor florestal brasileiro atualmente é o psilídeo-de-concha (Glycaspis brimblecombei). O inseto de origem australiana chegou ao Brasil em junho de2003 infestando clones de E. grandis x E. urophylla (E. urograndis), no estado de São Paulo, e se espalhou rapidamente utilizando como hospedeiro várias outras espécies do gênero Eucalyptus. Em pouco tempo este psilídeo se dispersou por diversos municípios de São Paulo, sendo encontrado também em Minas Gerais, Goiás e Paraná. Entre os anos de 2020 e 2023, o aumento do psilídeo-de-concha foi maior que 65% no país, segundo o Programa Cooperativo sobre Proteção Florestal (PROTEF) do IPEF. O psilídeo de concha utiliza como hospedeiro várias espécies do gênero Eucalyptus, com preferência ao E. camaldulensis e E. tereticornis.

O psilídeo-de-concha (Glycaspis brimblecombei)
O psilídeo-de-concha (Glycaspis brimblecombei)
Glycaspis brimblecombei em Eucalyptus spp. - A-Ovos; B-Ninfa; C-Adulto; D-Infestação em folha de eucalipto
Glycaspis brimblecombei em Eucalyptus spp. – A-Ovos; B-Ninfa;
C-Adulto; D-Infestação em folha de eucalipto
Ninfas de de Glycaspis brimblecombei de 1° ao 5° instar - A: 1º instar: coloração amarela, 3 segmentos antenais; B: 2º instar: coloração amarela, 3 segmentos antenais; C: 3º instar: coloração amarela, 5 segmentos antenais; D: 4º instar: coloração varia amarelo ao laranja, 7 segmentos antenais; E: 5º instar: coloração varia do laranja, amarelo ao verde, 9 segmentos antenais - Foto: IPEF
Ninfas de de Glycaspis brimblecombei de 1° ao 5° instar – A: 1º instar: coloração amarela, 3 segmentos
antenais; B: 2º instar: coloração amarela, 3 segmentos antenais; C: 3º instar: coloração amarela,
5 segmentos antenais; D: 4º instar: coloração varia amarelo ao laranja, 7 segmentos antenais;
E: 5º instar: coloração varia do laranja, amarelo ao verde, 9 segmentos antenais – Foto: IPEF
Conchas produzidas pelas ninfas de Glycaspis brimblecombei nas folhas de eucalipto - Foto: IPEF
Conchas produzidas pelas ninfas de Glycaspis brimblecombei nas folhas de eucalipto – Foto: IPEF
Folhas de eucalipto infestadas pela praga
Folhas de eucalipto infestadas pela praga

O psilídeo-de-concha (Glycaspis brimblecombei) pertence à ordem Hemiptera, subordem Sternorrhyncha e família Psyllidae. São insetos de corpo pequeno com aproximadamente 2 mm de comprimento, semelhantes a pequenas cigarrinhas, com pernas posteriores saltatórias e antenas bem desenvolvidas. A infestação e principal característica deste inseto, são as pequenas estruturas cônicas brancas, as conchas, produzidas durante a fase ninfal na superfície das folhas formadas pela excreção do inseto compostas basicamente de ceras e polissacarídeos, que abrigam as ninfas até a fase adulta. As ninfas do inseto apresentam cinco ínstares e são achatadas dorsoventralmente, com cor variando desde amarelo nos três primeiros ínstares a amarelo-alaranjado ao verde nos dois últimos ínstares e as tecas alares apresentam coloração escura.

Os danos observados no campo foram a redução no tamanho e deformação das folhas, bem como a presença de fumagina. Em plantas infestadas, ocorre o secamento de ponteiros e desfolha, podendo ocorrer desfolha de 100 %, sem possibilidade de recuperação. As plantas afetadas apresentam folhas cobertas por pequenas conchas cônicas, que podem causar desfolhamento e levar à morte das árvores. Outro dano causado é a redução da área foliar, que diminui a atividade fotossintética da planta e compromete seu desenvolvimento. Além disso, a infestação do psilídeo-de-concha pode favorecer o ataque de pragas secundárias e a ocorrência de doenças. A Embrapa estima que o inseto pode causar perdas de produtividade de até 30%.

Armadilha adesiva amarela, utilizada no monitoramento do psilídeo-de-concha (Glycaspis brimblecombei) em talhão de eucalipto
Armadilha adesiva amarela, utilizada no monitoramento do psilídeo-
de-concha (Glycaspis brimblecombei) em talhão de eucalipto

Manejo adequado

O controle se baseia na implementação de um programa de Manejo Integrado de Pragas (MIP), baseado no monitoramento da praga e suas interações com o ambiente e outros organismos. No Brasil, todas as empresas florestais utilizam um sistema de monitoramento para pragas, e o psilídeo-de-concha é uma delas. Cada empresa adota seu próprio sistema de monitoramento, mas o princípio de todas é basicamente o mesmo, com a utilização de armadilhas adesivas amarelas. Estas armadilhas possuem dimensões de 10 × 12 cm, as quais são instaladas a 1,5 m do solo entre árvores. Uma armadilha é utilizada para cada 200 ha (variando de acordo com a empresa), sendo que estas permanecem no campo cerca de 30 dias. Após esse período, são retiradas, plastificadas e enviadas para análise, onde serão realizadas contagens tanto do inseto-praga quanto do seu inimigo natural.

Controle biológico

No Brasil, diferentes formas de manejo podem ser adotadas para o controle do psilídeo-de-concha e o mais indicado é o controle biológico com Psyllaephagus bliteus, fungos entomopatogênicos, ou ainda com a utilização percevejos predadores. O controle biológico com Psyllaephagus bliteus (Hymenoptera: Encyrtidae) para controle do psilídeo-de-concha é adotado em muitos países onde existe a presença da praga.

A vespinha parasitoide australiana (Psyllaephagus bliteus) que controla o psilídeo-de-concha (Glycaspis brimblecombei) - Foto: Valter Jacinto
A vespinha parasitoide australiana (Psyllaephagus bliteus) que controla
o psilídeo-de-concha (Glycaspis brimblecombei) – Foto: Valter Jacinto

Logo após o registro da entrada dessa praga no país foi detectada também a presença de seu inimigo natural, introduzido acidentalmente junto com a praga, o endoparasitoide da fase ninfal Psyllaephagus bliteus, uma vespa também de origem australiana. Trata-se de um inseto muito pequeno, de coloração verde metálica, em que as fêmeas geralmente são maiores que os machos, sendo estes identificados por suas antenas com 10 segmentos de coloração amarelada e as fêmeas por 12 segmentos de coloração marrom.

Esse é o principal agente de controle biológico do psilídeo-de-concha. Esse inimigo natural parasita as ninfas, ovipositando de um a quatro ovos por ninfa de G. brimblecobei, entre o tórax e o abdome das mesmas, preferindo aquelas de terceiro ou quarto instares, mas o desenvolvimento do parasitoide irá ocorrer apenas quando o hospedeiro atingir o quarto ou quinto instar. As larvas, desse parasitoide, são vermiformes e esbranquiçadas, se alimentam e desenvolvem na cavidade abdominal das ninfas, consumindo-as, deixando-as com um aspecto de “múmia” (corpo dilatado e imóvel), antes de se transformarem em pupas.

A vespa parasitoide Psyllaephagus bliteus ovipositando em uma ninfa de Glycaspis brimblecombei, através da concha
A vespa parasitoide Psyllaephagus bliteus ovipositando em uma
ninfa de Glycaspis brimblecombei, através da concha

Entretanto, a população do parasitoide tem se mantido a níveis baixos no campo, ao contrário da população do psilídeo de concha (G. brimblecombei), que tem causado surtos no período mais seco do ano. Dessa forma, torna-se necessária a realização de liberações periódicas do parasitoide conforme aumenta a população da praga no campo. O indicativo para a realização dessas liberações se obtém pelo monitoramento que determina a flutuação populacional dos dois insetos no campo.

A vespinha parasitoide é responsável por 64% do controle de G. brimblecombei em campo mas isto varia com fatores bióticos e abióticos. As taxas de parasitismo, desse inimigo natural, têm diminuído, o que contribuiu para o aumento dos surtos populacionais de G. brimblecombe. Estudos realizados em 2007 afirmam que com liberações frequentes do parasitoide em áreas infestadas por psilídeo-de-concha, a porcentagem de parasitismo pode aumentar, principalmente em meses com temperaturas mais amenas, conseguindo porcentagens de parasitismo de 73 e 79% em temperaturas de 22,73 e 26,16°C, respectivamente.

O percevejo Atopozelus opsimus predando ninfas de Glycaspis brimblecombei
O percevejo Atopozelus opsimus predando ninfas de Glycaspis brimblecombei

O percevejo predador Atopozelus opsimus (Hemiptera: Reduviidae) também é visto como uma das formas de controle biológico do psilídeo-de-concha, pois consegue predar tanto ninfas quanto adultos do psilídeo. Para se alimentar da fase ninfal, o percevejo utiliza seu rostro como alavanca para retirar a concha e poder inserir seu estilete na ninfa. A média da alimentação deste percevejo é de 7,0 adultos e 6,0 ninfas, em um consumo médio de 13 indivíduos entre ninfas e adultos. Alguns estudos com controle microbiano a partir de fungos entomopatogênicos também estão sendo realizados para o controle do psilídeo-de-concha, sendo estes previamente testados em laboratório, os fungos que apresentaram melhores resultados no controle foram Beauveria bassiana e Metarhizium anisopliae. Entretanto, o controle desse psilídeo com fungos entomopatogênicos é difícil, uma vez que é necessário a umidade relativa superior a 60%, o que resultaria em baixa eficiência em regiões mais secas.

Os fungos entomopatogênicos Beauveria bassiana e Metarhizium anisopliae
Os fungos entomopatogênicos Beauveria bassiana e Metarhizium anisopliae

Controle químico

Existem alguns inseticidas químicos liberados para o controle de psilídeo-de-concha. Inseticidas de contato não são utilizados para controle deste inseto, pois, devido à concha que formam para sua proteção, os produtos só terão efeito sobre ninfas que estiverem fora da concha e adultos. Como o Brasil apresenta grandes maciços florestais de eucalipto, o controle químico do psilídeo-de-concha se torna quase que impraticável devido ao seu alto custo, baixa eficiência e também vai contra as certificações florestais.

Recentemente, foi lançado um produto de ação sistêmica e de contato que, sendo o fabricante, pode ser aplicado tanto de forma aérea quanto de forma terrestre, e a sua formulação em suspensão concentrada facilita a incorporação do produto na calda, apresentando flexibilidade de aplicação. Podem ser realizadas até três aplicações anuais, com um período de reentrada adaptado à necessidade de cada produtor. O fabricante promete que ao aplicar o produto, mesmo em altas incidências, o ciclo do psilídeo pode ser interrompido de forma eficiente, protegendo a floresta. Lembramos que o produto é perigoso à saúde humana, animal e ao meio ambiente. O uso só é autorizado sob receituário agronômico. Por isso, consulte sempre um Engenheiro Florestal.

A vespa parasitoide Psyllaephagus bliteus ovipositando em uma ninfa de Glycaspis brimblecombei, através da concha
A vespa parasitoide Psyllaephagus bliteus ovipositando em uma
ninfa de Glycaspis brimblecombei, através da concha

Conclusão

Portanto, a criação bem-sucedida do parasitoide em laboratório é primordial, visando ter estoque prontamente disponível para liberação de acordo com as necessidades de controle de cada área. Esse tipo de criação é pratica comum. O controle biológico clássico é, dentre as possíveis formas de controle do psilídeo-de-concha, a mais promissora. Por sua natureza, este controle oferece diversas vantagens, como menores custos e menor impacto ambiental, devido à especificidade de seu inimigo natural. Dessa forma, tornou-se necessária a criação de P. bliteus no Brasil, baseando-se nos programas de controle biológico desenvolvido nos EUA e México. Nesses países a taxa de parasitismo no campo varia de 7% a 92 %. Entretanto, maiores eficiências de controle são obtidas quando são realizadas liberações
periódicas do parasitoide, em adição à população que ocorre naturalmente no campo.

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