A ONG Ecotrópica, uma das mais influentes no pantanal, está no centro de uma investigação por envolvimento em um esquema de grilagem de terras públicas e privadas
A acusação, feita em dezembro de 2024, aponta que a organização teria ocupado cerca de 5 mil hectares de terras da União e de fazendas privadas, utilizando documentos fraudulentos de georreferenciamento e títulos ambientais para gerar lucros ilícitos, principalmente por meio da comercialização de Cotas de Reserva Ambiental (CRAs). A Cota de Reserva Ambiental (CRA) foi instituída pelo novo Código Florestal (Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012) para a regularização ambiental de Reserva Legal de imóveis rurais.
Este esquema foi denunciado pelo empresário e fazendeiro Bruno Teixeira Canabrava, proprietário da Fazenda São Gonçalo do Amolar, no Mato Grosso do Sul, que alegou que a Ecotrópica estava utilizando uma abordagem sofisticada de grilagem, muito além da tradicional ocupação física das terras.
Em vez disso, a ONG estaria manipulando documentos oficiais para registrar terras como áreas de reserva ambiental, possibilitando sua venda ilegal para outros produtores, que precisavam “compensar” o desmatamento em suas próprias áreas. A Ecotrópica teria oferecido essas cotas ambientais por aproximadamente R$ 2 mil por hectare, com potencial de lucro de até R$ 10 milhões com a comercialização de 5 mil hectares.
A legalidade questionada e a conivência de órgãos públicos
A prática de grilagem, ou seja, a falsificação de documentos para apropriação ilegal de terras, não é nova no Brasil, mas o uso de títulos ambientais para fins fraudulentos coloca em xeque a seriedade das ONGs e a eficácia do sistema de fiscalização ambiental.
Embora o processo de comercialização de cotas ambientais seja legal sob certas condições, a utilização dessas práticas pela Ecotrópica levanta sérias questões sobre sua moralidade e legalidade. O fato de a organização ter controlado terras que não poderiam ser utilizadas para emissão de títulos ambientais — devido à sua localização em áreas alagáveis — levanta suspeitas de conivência e falhas nos processos de georreferenciamento e na fiscalização por parte de órgãos como o INCRA e o IMASUL (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul).
Além disso, a Ecotrópica já controla aproximadamente 27 mil hectares no pantanal, sendo que grande parte dessas terras não poderia ser legalmente utilizada para gerar cotas ambientais. No entanto, aparentemente, a ONG conseguiu manipular o sistema para registrar essas terras como áreas passíveis de compensação ambiental.
A denúncia questiona a atuação de órgãos públicos responsáveis por garantir a legalidade desses processos, sugerindo que há falhas significativas ou até conivência interna, permitindo que a ONG ganhasse milhões de reais com a comercialização de títulos ambientais de áreas que, na prática, não deveriam ser comercializáveis.
O papel das ONGs e a falta de fiscalização eficaz
O caso da Ecotrópica ilustra uma preocupação crescente sobre a falta de fiscalização e a responsabilidade das ONGs no Brasil. Embora muitas dessas organizações desempenhem papéis importantes na preservação ambiental, existem casos em que elas se tornam envolvidas em esquemas fraudulentos que, em vez de proteger o meio ambiente, alimentam a corrupção e o descaso com as promessas feitas à sociedade. ONGs como a Ecotrópica, com grande visibilidade e apoio financeiro, podem, em alguns casos, se desviar de suas missões, gerando lucros ilegais por meio de práticas como a grilagem de terras.
O governo brasileiro e os órgãos responsáveis pela fiscalização precisam garantir um sistema mais rigoroso e transparente para garantir que as ONGs não sejam usadas como fachada para atividades criminosas. A falta de fiscalização adequada não só permite que esses esquemas prosperem, mas também mina a confiança do público nas organizações que realmente trabalham pela preservação do meio ambiente.
A falha do sistema de monitoramento de terras e títulos ambientais reflete um problema estrutural mais amplo, no qual ONGs e indivíduos se aproveitam da falta de controle para obter benefícios pessoais às custas do patrimônio público e do meio ambiente.
A denúncia e a reação das organizações
A denúncia da grilagem de terras, feita por Bruno Canabrava e o advogado Nelson Araújo Filho, gerou uma série de reações. A Ecotrópica, que tem uma grande reputação no campo da conservação, negou veementemente as acusações, chamando-as de difamação. A ONG afirmou que suas atividades são transparentes e legítimas, e que sempre buscou proteger o pantanal, um dos ecossistemas mais importantes do Brasil.
De fato, a Ecotrópica tem sido reconhecida por sua atuação na preservação do bioma, e seus líderes, como Angelo Rabelo, foram homenageados por sua contribuição à conservação ambiental. Rabelo, inclusive, recebeu prêmios de destaque, como o reconhecimento no The Explorers Club, em Nova York.
A ONG Instituto do Homem Pantaneiro (IHP), que também está envolvida em ações no Pantanal, se posicionou em defesa da Ecotrópica, afirmando que as acusações eram infundadas e que a organização tem uma sólida reputação no campo da preservação. A negativa das organizações e suas tentativas de rebater as acusações são compreensíveis, dado o impacto negativo que uma denúncia como essa pode ter em sua imagem pública.
A realidade do problema: ONGs, corrupção e impunidade
Este caso revela um problema mais amplo envolvendo a falta de fiscalização sobre ONGs e suas atividades no Brasil. Embora a maioria das organizações ambientais atue de maneira ética, algumas se envolvem em práticas ilegais, como a grilagem de terras e a falsificação de documentos, prejudicando o meio ambiente e a sociedade.
A Ecotrópica, com seu envolvimento em um esquema de venda ilegal de títulos ambientais, é apenas um exemplo de como a falta de um sistema de monitoramento eficaz pode ser explorada.
O governo precisa ser mais rigoroso na fiscalização dessas entidades. ONGs que recebem apoio financeiro do público e do governo devem ser submetidas a um sistema de auditoria constante, para garantir que suas atividades realmente cumpram os objetivos de preservação ambiental.
A falta de fiscalização adequada só incentiva a corrupção e prejudica os esforços legítimos de conservação. Além disso, a impunidade com a qual esses esquemas são tratados contribui para a perpetuação da corrupção, permitindo que essas organizações ilegais sigam operando sem enfrentar as consequências de suas ações.
A necessidade de fiscalização mais rigorosa
O caso da Ecotrópica é um alerta para a necessidade de maior responsabilidade por parte das ONGs e um sistema de fiscalização mais robusto por parte do governo. A falta de fiscalização e a impunidade em relação a práticas ilegais, como a grilagem de terras e a venda fraudulenta de títulos ambientais, não só prejudicam a preservação do pantanal e demais biomas, mas também comprometem a confiança da população nas organizações que se dizem comprometidas com a preservação ambiental.
O governo brasileiro precisa agir para garantir que todas as ONGs que operam no país, especialmente aquelas envolvidas em questões ambientais, sejam devidamente auditadas e monitoradas.
Somente com uma fiscalização eficaz será possível prevenir que esquemas fraudulentos como o da Ecotrópica prosperem e garantir que as verdadeiras iniciativas de preservação ambiental possam continuar seu trabalho sem serem manchadas por práticas corruptas.