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Ostra com novo sistema de cultivo

Uso de estruturas flutuantes realocáveis para o cultivo de ostras em áreas sujeitas a grandes variações de salinidade - Foto: Jefferson Francisco Alves Legat

Uma nova mesa flutuante para criação da ostra Crassostrea gasar, a principal espécie de ostra nativa cultivada no nordeste, foi desenvolvida pelos pesquisadores da Embrapa Tabuleiros Costeiros. A mesa móvel flutuante realocável para o cultivo de ostras, denominada Mesa Ostranne, é um equipamento simples e de baixo custo que pode ser construído pelo próprio produtor. Permite o acesso às ostras independentemente da amplitude da maré, reduzindo a carga de trabalho.

A estrutura possibilita, ainda, o deslocamento da estrutura de cultivo e da criação inteira para a margem e locais alternativos de manejo, a fim de proteger os moluscos de problemas que comprometem a produção, a exemplo da alta salinidade, fortes correntes, contato prolongado com o ar quente e outras intempéries.

A malacocultura (cultivo de moluscos) vem crescendo em águas quentes das regiões nordeste e norte do país, mas ainda enfrenta desafios para se firmar de forma competitiva. Estudos conduzidos em locais de cultivo apontam que ostras cultivadas em mesas flutuantes apresentam maiores taxas de crescimento e sobrevivência, independentemente da necessidade de realocação, quando comparadas a indivíduos criados em estruturas tradicionais fixas.

A nova mesa confirma essa tendência. No parque aquícola norte de Sergipe, um dos locais onde foi validada, 91% dos moluscos cultivados alcançaram tamanho mínimo comercial. Apenas 14% dos criados em mesas fixas tiveram o mesmo desempenho. A tecnologia resulta do projeto “Bases tecnológicas para a produção sustentável de ostras nativas no norte e nordeste do Brasil” (Ostranne), liderado pela pesquisadora da Embrapa Angela Legat. Segundo a pesquisadora, dois fatores explicam as maiores taxas de crescimento e sobrevivência de ostras cultivadas em estruturas flutuantes.

O primeiro é a proteção dos animais contra as altas temperaturas enquanto se encontram submersos. A exposição ao ar em altas temperaturas prejudica estruturas internas das ostras, afetando o crescimento e a sobrevivência. O segundo é a permanência constante das ostras na camada entre 20 cm e 30 cm de profundidade, independentemente da amplitude da maré. Essa camada superficial da água favorece a alimentação das ostras, uma vez que concentra a maior quantidade de microalgas.

Cultivo de ostras no manguezal

O pesquisador da Embrapa Jefferson Francisco Alves Legat ressalta que os resultados obtidos corroboram estudos anteriores realizados pela empresa em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Tais estudos comprovaram que ostras de um mesmo lote, cultivadas em áreas tropicais, apresentaram melhor desempenho zootécnico quando cultivadas com maior tempo de submersão e menor tempo de exposição ao ar e ao sol.

O cultivo de moluscos bivalves, a exemplo das ostras, é considerado a forma mais ambientalmente correta e sustentável para a produção de proteína animal. Esse molusco se alimenta de microalga, o que já elimina os custos e impactos do plantio de algo que vai ser transformado em ração e reduz a pegada ambiental da indústria de processamento e transporte de rações, além de evitar resíduos no ambiente de cultivo. Moluscos bivalves são aqueles que possuem o corpo formado por uma concha de duas partes, chamadas de valvas.

Crassostrea rhizophorae

Crassostrea rhizophorae
Crassostrea rhizophorae nas raizes de Rhizophorae mangle

A ostra nativa C. rhizophorae, conhecida como “ostra branca” em algumas localidades no Brasil, apresenta distribuição desde o Caribe até o Uruguai, sendo encontrada em raízes da planta do mangue Rhizophorae mangle e fixada em rochas no médio litoral, na região entremarés. A ocorrência desta espécie é modulada, principalmente, pela salinidade, sendo a faixa de salinidade em ambientes de sua ocorrência entre 7 e 28. Sementes da espécie sobrevivem em salinidade entre 15 e 25. Relatos sobre o início do cultivo desta espécie no Brasil datam de 1972, na Bahia. Animais da espécie podem atingir, em cultivo, altura >75mm após oito meses de cultivo, a partir de animais com tamanho inicial de, aproximadamente, 40mm. No Ceará, obtiveram-se animais com 60mm de altura em oito meses de cultivo. A partir de sementes produzidas em laboratório, obtiveram-se animais com tamanho de 48mm de altura após cinco meses de cultivo e com 45mm de altura após nove meses de cultivo.

Crassostrea gasar

Crassostrea gasar

Conhecida anteriormente como Crassostrea brasiliana, há alguns anos passou a ser chamada C. gasar. Vulgarmente chamada de “ostra do mangue”, ocorre em manguezais, estuários e costões rochosos, da costa do Pará até o estado de Santa Catarina. Sua ocorrência é relatada, também, na costa oeste da África, entre Senegal e Angola, sendo abundante ao longo do delta do Rio Nilo. Crassostrea gasar apresenta ampla tolerância à salinidade, podendo ocorrer entre 2,1 e 50, tendo seu ótimo entre 4 e 40. Cultivo de juvenis em condições de laboratório mostrou que a sobrevivência não foi afetada entre salinidades de 10 a 45. Entretanto, estudos têm demonstrado que C. gasar cresce melhor em ambiente estuarino do que em marinho. Por outro lado, locais onde a salinidade apresenta alta influência da precipitação não proporcionam um bom crescimento na estação chuvosa. Pesquisadores observaram que C. gasar cultivadas em áreas mais influenciadas por descarga fluvial apresentam menor crescimento, com um impacto negativo na produtividade dos cultivos. Relatos sobre o início das pesquisas para o cultivo de ostras nativas (provavelmente com C. gasar) datam de 1969, em Cananéia, SP, sendo realizadas pelo Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo. Subsequentemente, o Instituto de Pesca de São Paulo, em 1972, iniciou estudos sobre a captação de sementes em coletores e a engorda em tabuleiros. O cultivo de C. gasar no Brasil é proveniente de sementes de captação natural com uso de coletores ou de extração em estoques naturais através da extração de juvenis. Outra forma disponível para obtenção de sementes dessa espécie no Brasil, é através da produção em laboratório que comercializam aos produtores. A espécie tem um grande potencial para a expansão da ostreicultura brasileira e tem sido alvo de diversos estudos.

Produtores em cultivo com Mesa Ostranne

Fácil e de baixo custo

As novas mesas flutuantes para cultivo de ostras podem ser confeccionadas com tubos de aço galvanizado (25 mm), tubos de CPVC (54 mm) ou de PVC soldável (50 mm). As instruções e as vantagens e desvantagens de cada tipo de material são apresentadas em publicação técnica, de autoria de Jefferson e Angela Legat, entre outros. Para acessá-la CLIQUE AQUI.

As estruturas tubulares, uma vez cortadas e montadas conforme as instruções da circular técnica, servirão de base para acomodar e sustentar os “travesseiros”, estruturas retangulares com telas específicas que acomodam as conchas. O sistema é preso ao solo submerso da área de maré com uso de poitas (pesos de fundo) e cordas de fixação. A flutuação de toda a estrutura é garantida pelo uso de bombonas (boias) de 30 litros de volume.

Cenários

De acordo com dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), os moluscos ocuparam a segunda posição na produção mundial de animais aquáticos cultivados em 2020, representando 20% da aquicultura e 53% da maricultura. No Brasil, a malacocultura teve início na década de 1970, mas ainda apresenta características artesanais, mesmo com os seus avanços nas últimas décadas e com a existência de empreendimentos em quase todos os estados costeiros. Exceção a esse cenário é Santa Catarina, que concentra cerca de 97% da produção nacional de moluscos cultivados, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), também de 2022.

O desenvolvimento da malacocultura catarinense está associado ao maior nível de organização da cadeia produtiva, à maior concentração de profissionais e instituições de pesquisa e ao maior investimento na estruturação de instituições públicas e privadas do estado. Além disso, desde a década de 1990, Santa Catarina investe em pesquisas para desenvolver técnicas e tecnologias, adequando os sistemas de produção de moluscos às condições locais.

Cultivo de ostras em sistemas convencionais

Muitos estados brasileiros continuam adotando práticas implementadas na década de 1970 e desenvolvidas para países de clima temperado, com pouca ou nenhuma adaptação às condições ambientais e climáticas das áreas de cultivo situadas em águas costeiras tropicais.

Cultivo convencional fixo no nordeste em área de manguezal
Dois métodos: sistema móvel com bombonas flutuantes e fixo com estacas fincadas ao solo

A maioria dos sistemas convencionais adotados no norte e nordeste Brasil – cultivo de fundo confinado; sistema fixo suspenso próximo ao fundo do tipo mesa ou rack; e o sistema fixo suspenso próximo ao fundo do tipo varal – não permite a realocação das estruturas e a possibilidade de flutuação conforme o nível da água. Isso obriga o criador a ajustar sua rotina de trabalho aos horários das marés e a ficar exposto ao sol durante o manejo.

Outra desvantagem é que, sem flutuação, alguns desses sistemas acabam alojando as ostras cultivadas, dependendo do nível da maré em cada horário, em diferentes patamares da lâmina d’água, ou mesmo fora dela. Esses patamares nem sempre são ideais no que se refere às condições ambientais para o melhor desenvolvimento dos animais, como temperatura, salinidade e concentração de alimento.

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