Fazendeiro de MT gasta R$ 25 mi para desmatar o Pantanal com veneno usado pelos Estados Unidos na Guerra contra o Vietnã
Parece notícia antiga… Um crime ambiental de desmatamento de uma área preservada no Pantanal para plantar capim e abrir pastagem para gado.
Mas, dessa vez, a coisa toma um vulto realmente assustador. Não apenas pelo valor investido em agrotóxicos (25 milhões de reais) para cometer tal crime. Nem mesmo pela área gigantesca (80 mil hectares), que por si só já seria suficiente para causar espanto e comoção mundial! A área desmatada equivale ao tamanho da cidade de Campinas, em São Paulo. Mas o que realmente mais chamou a atenção foi a forma atroz que se desenvolveu toda a ação.
Substância tóxica foi usada em Guerra
Segundo a Sema, na pulverização aérea, ele teria usado 25 tipos de agrotóxicos, e pasmem, um deles tem a substância 2,4D, a mesma presente em um veneno chamado “agente laranja”, usado pelos Estados Unidos na Guerra contra o Vietnã.
O objetivo do fazendeiro, conforme a apuração do MPMT e da polícia, foi aniquilar a vegetação mais alta, fazendo um desfolhamento químico por pulverização criminosa despejada por avião para destruir a mata.
Imagens da área afetada mostram um efeito devastador: floresta seca, morta, e uma imensa mancha cinza no local. Peritos comprovaram em laboratório a contaminação na flora, fauna e na água.
Este processo de desmatamento com a aplicação de herbicidas vinha sendo realizado ao longo dos últimos três anos.
Denúncia anônima leva autoridades ao local
A Polícia Civil de Mato Grosso, por meio da Delegacia Especializada do Meio Ambiente (Dema), realizou, entre os dias 8 e 12 de abril, a segunda fase da Operação Cordilheira, para cumprimento de ordens judiciais de arresto, sequestro e indisponibilidade de bens referente ao desmatamento químico.
O crime foi descoberto por meio de uma denúncia anônima. Assim que chegaram ao local, as autoridades apreenderam um avião alugado pelo fazendeiro. O avião tem capacidade de pulverizar, em cinco minutos, veneno para desmatar uma área do tamanho de um campo de futebol. Notas fiscais apreendidas também teriam mostrado que o fazendeiro comprou 240 toneladas de sementes de capim de espécies exóticas para pastagem.
O nome do fazendeiro mato-grossense criminoso é Claudecy Oliveira Lemes. Ele já é réu em dois outros processos de crimes ambientais: tentou alterar o curso natural de um rio e foi flagrado desmatando vegetação nativa em área de preservação.
Ele já tem 15 autuações por danos ambientais ao Pantanal e deveria estar recuperando a vegetação em áreas da fazenda, por acordo assinado com o Ministério Público. No entanto, ao que parece, o fazendeiro não está nem aí para as autoridades brasileiras de quaisquer instâncias e continua a agir de forma criminosa e irresponsável.
Conforme a reportagem, se condenado, ele deverá pagar multa de R$ 2,9 bilhões e terá que reparar os danos ambientais, recuperando a vegetação, com um custo estimado de R$ 2,3 bilhões.
Pelo cometido, um único infrator foi multado em mais de R$ 2,8 bilhões, a maior sanção administrativa já registrada pela Secretaria de Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema-MT). Mas a Polícia Civil quer responsabilizar ainda o piloto do avião, Nilson Costa Vileva, e o agrônomo Alberto Borges Lemos, responsável por escolher os produtos para o “coquetel de veneno”.
O pecuarista tem 11 fazendas em Barão de Melgaço e a fazenda alvo da investigação está embargada. Além disso, todas as propriedades do acusado serão administradas por uma empresa definida pela Justiça até o fim das investigações.
Rastro da destruição vai se alastrar ainda mais!
A aplicação por via aérea dos produtos tóxicos agrava ainda mais a situação. O Pantanal, por se tratar de área alagada, possibilita que as substâncias químicas sejam conduzidas pelas águas e atinjam a fauna, a ictiofauna e até mesmo os seres humanos, com a contaminação dos rios.
Pesquisadores afirmam que os agrotóxicos podem causar nas pessoas vários tipos de câncer, distúrbios hormonais, infertilidade, depressão, problemas respiratórios ou até levar à morte. Eles também defendem que o governo federal precisa desestimular a pulverização aérea de agrotóxicos e fiscalizar a atividade.
De acordo com estudos, há mais de 15 mil casos de intoxicação por agrotóxicos notificados no Brasil nos últimos anos, com 439 mortes.
Doenças
Trabalhadores que aplicam esses produtos e consumidores de alimentos com agrotóxicos correm risco de desenvolver vários tipos de doenças, como câncer e mal de Parkinson, por exemplo, e até má-formação fetal.
No Brasil, 720 mil toneladas de ingrediente ativo de agrotóxico foram comercializados em 2021, ano no qual as empresas que fabricam esses produtos faturaram US$ 14,2 bilhões.
O poder público deve desestimular o uso da pulverização área, para diminuir os impactos à saúde e ao meio ambiente. Vale lembrar que 20% dos agrotóxicos usados no Brasil são classificados oficialmente como “extremamente tóxicos”.
População vulnerável
Diversas famílias de agricultores já foram atingidas pela “deriva” — quando a pulverização de agrotóxicos atinge áreas próximas que não usam esses produtos. Elas tiveram perdas na produção e experienciaram danos ao solo, às águas, à saúde e à flora e fauna local.
Uma pesquisa de 2021 mostrou que, de 30 casos de deriva de agrotóxicos naquele ano, 21 eram de pulverização aérea e que, em 2009, havia 975 aeronaves fazendo pulverização de agrotóxicos, número que aumentou para 2,4 mil em 2021.
Dados comprovam que 19% do agrotóxico pulverizado por aviões acaba sendo levado pelo vento para áreas vizinhas. Os impactos negativos dos agrotóxicos prejudicam de maneira mais acentuada as populações mais vulneráveis. É preciso que as autoridades aumentem a fiscalização da produção e uso de agrotóxicos e da pulverização aérea, que atualmente é feita até por drones, não apenas por aviões ou helicópteros.
(Os casos ora relatados não tem ligação direta com o crime ambiental apresentado na matéria. Servem apenas de alerta a respeito da questão da pulverização aérea de agrotóxicos em geral).
MPMT pede prisão preventiva do pecuarista ao TJ
O Ministério Público do Estado de Mato Grosso recorreu da decisão que indeferiu o pedido de prisão preventiva do pecuarista Claudecy Oliveira Lemes. Ele terá que pagar R$ 5,2 bilhões entre multas aplicadas pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e valoração do dano ambiental.
Considerado o responsável pelo maior dano ambiental já registrado no estado de Mato Grosso, o investigado foi alvo de decisões judiciais que resultaram na indisponibilidade de 11 fazendas, na apreensão judicial dos animais dessas propriedades e no embargo das áreas afetadas.
A Justiça determinou ainda a suspensão do exercício da atividade econômica e proibiu o investigado de se ausentar do país. As medidas cautelares, diversas da prisão, também foram impostas ao responsável técnico pelas propriedades, Alberto Borges Lemos, e ao piloto da aeronave que pulverizou o agrotóxico, Nilson Costa Vilela. A decisão judicial foi proferida no dia 18 de março.
Somente entre julho e agosto de 2023, foram aplicados nove autos de infração e nove termos de embargo e interdição em razão de degradações ambientais praticadas pelo investigado. O inquérito está em fase final de conclusão. O investigado já responde a três ações penais e nove inquéritos civis.
O que dizem as defesas dos acusados?
Os advogados de Claudecy Oliveira Lemes dizem que ele vem cumprindo o acordo de reposição florestal feito com o Ministério Público de Mato Grosso. O advogado do piloto Nilson Costa Vilela diz que seu cliente aplicou sementes nas fazendas citadas no inquérito, mas nega a acusação de despejo de agrotóxicos para desmatamento químico. O agrônomo Alberto Borges Lemos não foi localizado.