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Polinização do cacau com abelhas adestradas

Floração do cacaueiro

O cacaueiro (Theobroma cacao) é uma planta com polinização cruzada na maioria das vezes, ou seja, o pólen é transferido da parte da masculina da flor (antera) para a parte feminina da flor (estigma) de uma outra planta e o processo de polinização manual do cacau normalmente utilizado, envolve um significativo investimento de tempo, cuidado e, claro, dinheiro.

No processo, que é feito por produtores rurais em diversas plantações do território nacional, é preciso pegar cuidadosamente uma das flores, coletar o pólen, com ajuda de uma pinça ou de um pincel e aproximar da parte reprodutora feminina de outra planta, preferencialmente pela manhã, o horário de maior fertilidade das flores. Mesmo aproveitando esse horário especial, algumas flores podem cair e não serem fecundadas. Pequenas e frágeis, as flores de cacau são polinizadas cautelosamente e uma a uma nesse processo manual. Por isso, investir em um polinizador profissional pode ser a chave para garantir melhores resultados.

A polinização manual é bastante trabalhosa e tem um custo elevado, então os pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Tecnológico Vale (ITV), em Belém (PA), tiveram a ideia de estudar abelhas, que são polinizadoras viáveis para o tamanho das flores de cacau. Eles planejam “adestrar” abelhas brasileiras sem-ferrão para polinizar as flores do cacau. Entre as mais de 180 espécies que existem na região amazônica, onde a planta é cultivada, 52 têm o tamanho ideal para serem polinizadoras. Segundo os técnicos, o método pode triplicar a produção do cacau onde é feita, quando comparado a plantios sem intervenção humana. A expectativa dos pesquisadores é de que a polinização assistida feita por abelhas treinadas aumente o cultivo e a produtividade de forma significativa.

Moscas das famílias Ceratopogonidae e Cecidomyiidae são consideradas as principais polinizadoras do cacau, com base em registros desses insetos visitando as flores. Com cerca de 3 mm de comprimento, aproximadamente cinco vezes menores que as flores do cacau, elas conseguem chegar aos órgãos reprodutores inacessíveis a insetos maiores. Sabe-se muito pouco sobre a polinização natural das flores de cacau, quando se compara com estudos sobre outras espécies frutíferas brasileiras. A dificuldade acontece justamente por conta do tamanho das flores, que têm entre 10 e 15 mm de diâmetro.

O processo é bem desafiador porque, além de pequena, a flor do cacau tem uma estrutura arquitetônica muito complexa. Os órgãos reprodutores dessas flores estão protegidos por estruturas que atuam como barreiras e dificultam a chegada de polinizadores tanto até o pólen quanto ao estigma, que conduz aos ovários. As moscas, aparentemente, não são eficientes no trabalho de polinização. Alguns estudos já observaram que esses insetos carregam muito pouco pólen quando visitam as flores de cacau.

Outra limitação das moscas diz respeito aos seus hábitos, mais ativas à noite e ao amanhecer, enquanto as abelhas trabalham durante o dia, principalmente de manhã. E isso é vantajoso, pois a parte feminina dessas flores têm sua fertilidade máxima pela manhã, até a hora do almoço. Porém, não existe comprovação de que essas abelhinhas atuarão efetivamente como polinizadoras. O fato de as abelhas visitarem as flores não garante que elas depositarão o pólen na parte feminina da flor e que isso vai gerar fecundação e produção de frutos, por isso a opção pelo adestramento do inseto se justifica.

Segundo os pesquisadores, as abelhas são atraídas para as flores pelo cheiro. A ideia é treiná-las, associando o perfume da flor do cacau a uma recompensa para que elas busquem o pólen e fertilizem outras plantas. Não basta colocar as abelhas onde está o cacau, é preciso ensiná-las a trabalhar ali.

Abelha jataí (Tetragonisca angustula) na flor do cacaueiro
Foto: Luciano Costa/Instituto Tecnológico Vale (ITV)

A ideia de cooptá-las para incrementar a produtividade do cacau é inspirada em exemplos que já existem de treinamento de abelhas-africanizadas com ferrão (Apis mellifera). Na Argentina, pesquisadores da Universidade de Buenos Aires apresentaram resultados positivos de polinização assistida em plantações de maçãs e peras. No Brasil, há aplicações similares em cultivos de soja. O grupo espera pôr em prática o treinamento das abelhas nas plantações de cacau em breve.

Há muito trabalho pela frente e não existe comprovação de que essas abelhas atuarão efetivamente como polinizadoras. O fato delas visitarem as flores não garante que depositarão o pólen na parte feminina da flor e que isso vai gerar fecundação e produção de frutos. Mas os técnicos estão otimistas, pois a ideia tem muita chance de dar certo. Outra vantagem do projeto diz respeito à adaptação às novas condições impostas pela crise climática. Segundo os técnicos, no futuro, a polinização será assistida em boa parte dos cultivos, porque o impacto do clima sobre a distribuição de abelhas é tão grande que o número de espécies vai diminuir. Essas pequeninas abelhas terão mais chance de aguentar o calor porque seu sistema de termorregulação é diferente daquele das abelhas maiores, essenciais na produtividade de muitas plantas usadas como alimento.

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