É necessário o desenvolvimento de novos trabalhos de levantamento que originem mapeamentos de solos mais detalhados no estado
O auditório da Embrapa Solos (RJ) recebeu, na semana passada, o evento técnico O potencial dos solos do estado do Rio de Janeiro para culturas emergentes, o último da série encontros que o centro de pesquisa promoveu este ano para discutir temas relevantes demandados pela sociedade. As culturas de lúpulos para cerveja, oliveiras para extração de azeite, uvas viníferas, laranjas com indicação geográfica e cafés especiais foram os destaques.
O evento teve transmissão ao vivo pelo canal da Embrapa no YouTube. A palestra da pesquisadora da Embrapa Solos Maria de Lourdes Mendonça Santos Brefin, discorreu sobre “O potencial de uso agrícola das terras do Rio de Janeiro perspectivas para novas culturas”. Os estudos coordenados pela Embrapa Solos ao longo dos anos para levantamentos dos solos do Rio de Janeiro demonstram que o estado tem 81% de terras altas (latossolos, argissolos e cambissolos) e 14% de terras baixas (cambissolos, gleissolos e neossolos plúvicos).
O mapa de solos do estado, na escala 1:250.000, revela grande variabilidade de ambientes e solos, onde ocorrem praticamente todas as 13 classes de solos do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos, relevo acidentado, fortes restrições climáticas e também áreas com limitações de uso (restinga, baixada e afloramento de rochas). Destacou a necessidade de novos trabalhos de levantamento que originem mapeamentos de solos em escalas mais detalhadas no estado, como está previsto para todo o Brasil no âmbito do Programa Nacional de Levantamento e Interpretação de Solos do Brasil (PronaSolos).
A pesquisadora lembrou que os solos são um recurso não renovável na escala humana, e 33% dos solos no mundo estão em processo de degradação, destacando que o estado do Rio de Janeiro também possui muitas áreas com pastagens degradadas, que podem ser recuperadas e reinseridas no processo produtivo.
Especialistas em culturas emergentes mostraram o bom potencial para cultivo no estado do Rio de Janeiro, dividindo suas experiências com o público. Um destaque foi sobre a cultura da oliveira e o potencial do mercado de azeite no Brasil, mostrando a possibilidade para o incremento da produção local, já que apenas 0,1% do azeite consumido pelos brasileiros são produzidos no país e as excelentes perspectivas para o cultivo de oliveiras em andamento em Nova Friburgo (RJ), cuja primeira colheita está prevista para 2025.
Abordou-se também sobre a cultura da uva e a produção de vinho na região serrana fluminense, salientando a importância dos solos. O cultivo de uvas para produção de vinho na região tem evoluído, em qualidade e quantidade, a ponto de as quatro cantinas produtoras existentes atualmente não darem conta da demanda. Um dos principais desafios apontados atualmente é promover o desenvolvimento do enoturismo na região, para que a qualidade dos vinhos fluminenses seja conhecida pelo público.
Outro tema que despertou muito a atenção dos presentes foi a palestra sobre a cultura do lúpulo e os efeitos da nutrição, adubação e irrigação para o sucesso da produção. O estado teve seu primeiro viveiro reconhecido pelo Ministério da Agricultura para produção de mudas de lúpulo no Brasil. Em 2018, foi criada a Rede de Fomento à Cultura do Lúpulo na Região Serrana Fluminense (Rede Lúpulo), e desde então estão sendo conduzidos diversos trabalhos de pesquisa e extensão na região, para validação de um sistema de produção de lúpulo para ambientes tropicais. Em 2023, a região serrana do RJ produziu 8 toneladas de lúpulo, que abasteceram, sobretudo, o mercado cervejeiro local.
Outro trabalho apresentado abordou como a ciência ajudou no processo de Indicação Geográfica (IG) da laranja da região de Tanguá (RJ), demonstrando o nexus causal entre solo e clima e a qualidade diferenciada dos frutos. A conquista do selo de IG só foi possível por meio de estudos conduzidos por pesquisadores da Embrapa, que tiveram o desafio de comprovar tecnicamente que a qualidade e as características peculiares das laranjas da região estão relacionadas, essencialmente, ao meio geográfico, o que compreende os fatores naturais e humanos. A análise das características físico-químicas dos frutos e a sua correlação com os fatores naturais da região são exigidos pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) para a solicitação de reconhecimento da região como IG, na espécie Denominação de Origem (IG-DO). As laranjas da região de Tanguá abarcadas pela IG-DO são da espécie Citrus sinensis, das variedades Seleta, Natal Folha Murcha e Natal Comum. As características únicas dos frutos são partilhadas pelos laranjais dos municípios fluminenses de Araruama, Itaboraí, Rio Bonito e Tanguá.
Coube à Embrapa Solos a análise dos fatores ambientais de clima e solos e da área da delimitação geográfica da IG-DO. Já a Embrapa Agroindústria de Alimentos realizou as coletas e análises químicas e sensoriais dos frutos das três cultivares, nas diferentes épocas de colheita. Os estudos desenvolvidos pelas equipes das duas unidades foram, então, correlacionados, comprovando que os solos, o regime de chuvas e o clima da região delimitada influenciam diretamente na composição físico-química dos frutos.
Fechando o painel, a exposição foi sobre o êxito da cultura de café especial premiado em Porciúncula (RJ), no Noroeste fluminense. A produção convencional foi convertida em uma linha de cafés especiais 100% Arábica, investindo-se em estudos, tecnologias e infraestrutura, uma novidade para a região. Uma associação foi formada recentemente para gerenciar o processo de solicitação de Indicação Geográfica do café do Alto Noroeste, responsável por 80% da produção de café do estado do Rio de Janeiro.
Os dois primeiros encontros da série promovida pela Embrapa Solos aconteceram no dia 15 de maio, com um debate sobre mercado de carbono, e no dia 29 de maio, sobre a importância das parcerias institucionais, por ocasião da comemoração dos 49 anos da Embrapa Solos.