APICULTURA -  Como montar um apiário

Pesquisadores do DDPA coletando amostras de solo - Foto: Fernando Dias/Seapi

O Rio Grande do Sul ainda enfrenta os reflexos das enchentes de maio que impactaram mais de dois milhões de pessoas e 200 mil propriedades. Muitas áreas no território gaúcho que não poderão ser semeadas na próxima safra. Nesse cenário, autoridades, entidades e público se reuniram nesta semana, na Expointer, para debater soluções para a reconstrução do estado.

Quando se discute reconstrução do solo, automaticamente levanta-se a questão da geração de renda para o produtor rural. Além da questão agronômica envolvida neste processo, discute-se também diversificação de culturas e redirecionamento do produtor para outras atividades agropecuárias quando for necessário. Levantamento da Emater-RS aponta que pelo menos três milhões de hectares foram afetados pela tragédia que se abateu no estado. Estima-se que sejam necessárias décadas para que eles possam ser recuperados. Foram regiões assoladas por 30 dias em um espaço muito curto por chuvas de 450 mm, 500 mm e até 700 mm, o que provocou uma alteração significativa no solo, particularmente nas características químicas, segundo os técnicos.

Estudo feito por pesquisadores da UFRGS e membros da Associação de Conservação de Solo e Água estima prejuízo de R$ 6 bilhões nas áreas devastadas. Os danos calculados se dão em solos e nutrientes. A enxurrada atingiu, principalmente, a camada que concentra o maior acúmulo de matéria orgânica, e, portanto, a parte mais fértil desses terrenos. A recuperação das áreas vai exigir correção, reconstituição do solo e adaptação dos modelos produtivos.

O solo foi muito prejudicado pela enchente na serra gaúcha - Foto: Fernando Dias/Seapi
O solo foi muito prejudicado pela enchente na serra gaúcha – Foto: Fernando Dias/Seapi

Segundo a Farsul (Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul), as estimativas indicam que a recuperação total do cenário agrícola deve levar uma década. O solo encharcado e saturado impede a infiltração de mais água devido ao excesso de umidade, o que tem levado a sérias consequências como erosões que arrastam nutrientes, matéria orgânica e até mesmo camadas superficiais do solo, tornando-os irreparavelmente danificados. Para formar só 1 cm de solo, são necessários de 300 a 400 anos, enquanto em um único evento climático, como as recentes enchentes, foram perdidos até 20 cm de solo em questão de horas.

A situação se mostra ainda mais alarmante pois a falta de oxigênio no solo saturado compromete a sobrevivência dos organismos responsáveis pela fertilidade e vitalidade, bem como o desenvolvimento adequado das plantas. Sem oxigênio, os processos biológicos essenciais para a saúde do solo são interrompidos, levando à morte desses organismos e à degradação ainda maior.

Uma força-tarefa de mais de 300 profissionais e técnicos da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi), da Emater/RS-Ascar e do Departamento de Solos da Faculdade de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) está a campo para elaborar um raio X da condição das terras produtivas no estado e está levando uma luz no fim do túnel para os produtores que tiveram o solo arrasado pela calamidade no RS. O grupo, que percorre o Interior desde junho, agora, alerta sobre a complexidade do processo de recuperação das áreas estruturalmente modificada pelas águas.

É como um exame de sangue. Primeiro se faz a coleta do solo, depois a análise laboratorial, a interpretação deste exame e então a recomendação do que precisará ser reposto. Com base na mancha de inundação identificada pela Embrapa, foram mapeados os 120 municípios com a piores condições de solo para se aprofundarem os estudos, integrando a chamada emergência em rota, onde os trabalhos estão concentrados. São mais de 6 mil locais com dificuldades de solo identificados, os “no olho do furacão”, ou seja, onde as águas afetaram desde as lavouras até as casas dos produtores e todas as demais estruturas produtivas desses locais.

Técnico coletando amostra de solo - Foto: Fernando Dias/Seapi
Técnico coletando amostra de solo – Foto: Fernando Dias/Seapi

O primeiro resultado do esforço conjunto da academia e da extensão rural foi publicado na Nota Técnica nº 1. Sabe-se que o processo de recuperação dos solos será desafiador, pois será preciso recuperar a qualidade, não somente a parte química do solo, mas também a parte física e biológica e o maior desafio, segundo os pesquisadores, é trazer as terras afetadas de volta aos níveis de produção pré-existentes. Por isso, as tarefas de recuperação devem ser organizadas e planejadas, dada a peculiaridade de cada situação.

Os técnicos destacam a diversidade de situações que estão encontrando, muitas vezes, dentro da mesma propriedade. Por exemplo: nas análises preliminares, observa-se aumento no pH, o que uma tentativa de aplicação de calcário, sem embasamento de recomendação pela análise, incorreria em agravamento da situação. Um fato inédito trazido pela tragédia foi a formação de grandes áreas de sedimentação nas áreas planas. Com essa nova situação, os produtores estão buscando orientações sobre como agir, e os técnicos estão buscando na literatura internacional casos semelhantes para auxiliar nestas soluções. Existem áreas com 4 a 5 metros de depósito de areia. Em outras, houve remoção da camada mais fértil do solo, e há casos de elevada compactação.

A primeira ação foi realizar o diagnóstico da fertilidade do solo através da coleta de amostras em diferentes pontos das propriedades, pois pode ter havido deposição de areia (sedimento) em uns e perda de solo em outros. Com a amostragem, os técnicos começaram a conhecer a composição química desses solos alterados pelas enchentes e enxurradas. Os acadêmicos e os extensionistas já percorreram o Vale do Caí (Bom Princípio e Feliz) e o Vale do Taquari (Muçum e Roca Sales). O roteiro de análises seguiu para as regiões da Serra e das Terras Baixas.

Solo degradado com camada considerável de areia na parte superficial - Foto: Laboratório de Solos/UFRGS
Solo degradado com camada considerável de areia na parte superficial – Foto: Laboratório de Solos/UFRGS

Desafios e as tecnologias do Plano ABC+RS para a recuperação

Todo esse processo de recuperação dos solos do RS passa pela adoção das tecnologias do Plano ABC+RS. A política pública de adaptação às mudanças climáticas no setor agropecuário gaúcho preconiza a adoção de tecnologias que promovem maior resiliência para os sistemas de produção agropecuários. A principal delas é o Sistema Plantio Direto (SPD) que tem como as principais diretrizes, plantio em nível, revolvimento restrito a linha de plantio, cobertura permanente do solo com palha e plantas e a rotação de culturas.

Além disso se prevê a utilização de bioinsumos, a integração lavoura pecuária floresta, as florestas plantadas e as práticas de recuperação de pastagens degradadas. Segundo os técnicos, se o produtor conseguir realizar essas práticas, vai proporcionar a recuperação do carbono do solo que é o principal indicador de qualidade do solo. Nos casos em que a prática for insuficiente, a recomendação é utilizar os terraços. O sistema, que têm importante papel no controle do escoamento superficial, pode auxiliar na drenagem das chuvas intensas, além de auxiliar no armazenamento e na distribuição de água.

Reunir especialistas e formuladores de políticas públicas para desenvolver estratégias de manejo, que possam ajudar na recuperação e na prevenção de danos futuros é de suma importância. Dentre as medidas ainda sugeridas pelos especialistas, estão o cultivo de plantas de cobertura para proteger o solo durante os períodos de entressafra, a implementação de sistemas de controle de erosão mais eficazes e a promoção de práticas agrícolas sustentáveis que promovam a saúde do solo e a retenção de água. Todas essas tecnologias promovem a melhoria da qualidade do solo e todo esse trabalho será fundamental para marcar o recomeço dos produtores na atividade.

Trabalho de coleta de amostras do solo em área afetada pelas chuvas - Foto: Jefferson Botega/Agência RBS
Trabalho de coleta de amostras do solo em área afetada pelas chuvas – Foto: Jefferson Botega/Agência RBS

As Notas Técnicas

A produção de notas técnicas possibilitará o embasamento científico e a divulgação do conhecimento na área, visando nortear técnicos, produtores e entidades ligadas à produção agropecuária para o restabelecimento do solo agrícola e das bases dos sistemas produtivos afetados pelas enchentes e extremos climáticos no Rio Grande do Sul. As terras agrícolas precisam de reparos biológicos, físicos e químicos, para recuperação a fertilidade do solo antes de retornar à produção, aponta a Nota Técnica n° 1. Entre as práticas recomendadas estão:

  • Remoção de detritos orgânicos;
  • Remoção de depósito de sedimentos;
  • Realização de amostragem e análise química do solo contemplando acidez e disponibilidade de macro e micronutrientes;
  • Reparo de sulcos de erosão e voçorocas;
  • Descompactação superficial do solo.

A indicação geral para os produtores é o adequado planejamento do uso das terras, já que estes fenômenos, como aponta a ciência, devem ser cada vez mais frequentes. Este planejamento deve considerar não somente a organização das propriedades agrícolas, mas também a integração com propriedades vizinhas e dentro das bacias hidrográficas (Nota Técnica n° 2), considerando os fluxos e disponibilidade de água para se adequar a períodos de excesso e falta de água. Os técnicos lembram que a água não respeita cercas, passa de uma propriedade para outra, por isso a necessidade de ações conjuntas.

As próximas Notas Técnicas deverão tratar de recuperação da fertilidade do solo, recuperação de áreas atingidas por voçoroca, tipo de mecanização a ser utilizada na recuperação de áreas e na remoção de sedimentos, entre outros assuntos. Ainda não há uma definição sobre o número de publicações, mas a ideia é ter entre quatro e seis, com textos curtos, de fácil leitura para produtores e extensionistas.

As bombas de sementes foram lançadas de helicópteros sobre as áreas afetadas
As bombas de sementes foram lançadas de helicópteros sobre as áreas afetadas

Bombas de sementes

Os gaúchos estão empenhados em ajudar no processo de reconstrução. No Dia de Proteção às Florestas (17 de julho), uma ação significativa foi realizada para contribuir com o reflorestamento do Vale do Taquari, por meio do projeto Semear. Cerca de 500 kg de sementes de espécies nativas e forrageiras foram lançadas por helicópteros sobre as encostas devastadas dos municípios de Santa Clara do Sul, Marquês de Souza e Pouso Novo. A iniciativa pretende acelerar a estabilização do solo e reduzir as chances de novos deslizamentos na região. Helicópteros do exército lançaram 5 milhões de sementes de 28 espécies da Mata Atlântica para ajudar na recuperação das áreas atingidas.

A ação busca mitigar os danos ambientais e prevenir futuros desastres, promovendo a regeneração da vegetação nativa. Além do lançamento de sementes, a ação contou com a participação ativa da comunidade local. Alunos de escolas públicas plantaram mudas de árvores no Parque Linear de Santa Clara do Sul, junto ao Arroio Saraquá. A ação de reflorestamento também contou com a colaboração de diversas instituições, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente, o Exército Brasileiro, o Tribunal de Contas da União e a Secretaria Estadual de Meio Ambiente).

Sanidade animal

O encontro na Expointer também trouxe outro assunto de grande relevância para o estado: a sanidade animal. Desde os avanços da abertura de novos mercados com o status de livre de aftosa sem vacinação até os desafios pós catástrofe, com a perda de plantéis e doenças. A produção animal responde por uma fatia significativa do PIB gaúcho e muitas granjas foram impactadas. A biosseguridade é um destaque e mostrou o potencial do setor em contornar problemas como o recente caso de Doença de Newcastle.

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